BEM-QUERER QUE DEVE SER
Robustece-a
Dizer não nunca termina
Uma vera relação,
Robustece-a, não a mina,
Mina mas é uma ilusão.
Passar
Passar a vida a anular-te
Não passes, senão depois
O que irás assinalar-te
É que enganaram-se os dois.
Aberto
Se alguém estiver aberto,
Ligações, não diferenças
Há entre as gentes, decerto,
Jamais racistas sentenças.
Comida
O amor importa na vida,
Mesmo se a vida atormenta,
Quanto me importa a comida,
Mesmo se mal me alimenta.
Lei
Só uma lei venera o amor,
Seja lá qual for a trama
Com que se lhe teça o teor:
- Tornar feliz a quem se ama.
Problema
Problema de ser amado?
Falso primeiro lugar,
Pois o problema encontrado
É o de ser capaz de amar.
Mar
Amar alguém, se é profundo
Mar sob infinda procela,
É de ir da pessoa ao fundo,
É de envelhecer com ela.
Formosura
Formosura, olha o amor,
Não colhas doutrem conselho,
Não olhes o adulador
Que se oculta em teu espelho.
Meio
De quem nos ama esperamos,
No meio do tempo louco,
Sobretudo, em muitos ramos,
Que nos dê de tempo um pouco.
Buscarmos
Sempre o outro sexo existe
De o buscarmos no sentido
E não no erro que persiste
De ele ser compreendido.
Passagem
Quanto mais amor nós temos
A fecundar o infecundo,
Tanto mais fácil faremos
A passagem pelo mundo.
Fuga
Na guerra do amor,
Quando não há glória,
A fuga é o melhor,
A fuga é a vitória.
Chave
Sempre é do erro a fechadura
Que mantém fechada a porta.
Abre-a com a chave pura
Do amor que à luz nos transporta.
Ocasiões
Nada é pequeno no amor.
Quem ocasiões aguardar
Para enternecer-lhe o teor
É porque não sabe amar.
Fizer
Se fizer alguém feliz
Porque então o deixaria?
E, se o fizer infeliz,
Porque não trocá-lo um dia?
Sempre
Todo o amor por interesse
Morre com o que o gerou.
O desinteressado, esse
Para sempre então durou.
Tolo
É tolo quem se quiser
Opor a um amor que apele,
Como se houvera o poder
De poder lutar com ele.
Vacatura
Na vacatura suposta
Por trás de qualquer alvor,
Única será resposta
Talvez, porventura, o amor.
Bem
O bem único da vida
É o amor. Amai, portanto,
Que tudo o mais, em seguida,
Brilha como por encanto.
Tudo
O amor pode fazer tudo
E também todo o contrário.
Cuidado, pois, sobretudo,
Com tudo o que nele é vário.
Preferiam
Um doutro eram tão chegados
Que preferiam então,
Se doutra escolha arredados,
A morte à separação.
Cede
Cede ao amor e então deixa
Que os demais, em liberdade,
O recolham na fateixa
Do nome que lhes agrade.
Igualdade
Só reconhece a igualdade
Qualquer verdadeiro amor,
Jamais a disparidade:
Onde o amor, não há senhor.
Melhor
Quem é que melhor conhece
Que o coração despertado
Que hesita, engana-se, esquece,
Antes de haver-se fixado?
Honra
A honra se retribui
Com honra de igual pendor,
Como gratuito igual flui
Um amor por outro amor.
Sem
Das verdades a verdade
É que é sempre bem melhor
Viver sem felicidade
Do que viver sem amor.
Recíproca
Ou recíproca a atracção
É e mútua se alimenta
Ou não há futuro, não,
Para o amor que se inventa.
Triste
Triste é o homem que só ama,
Herde da vida quanto herde
No acaso do vento e chama,
Um qualquer bem quando o perde.
Viável
Raramente conseguimos
Que com amor nos encimem
Mas é viável noutros cimos
Fazer com que nos estimem.
Flor
O amor no que tem de flor
(Perfume, forma de ser,
Pétala de furta-cor...)
Tens de deixá-lo crescer.
Responsáveis
Seremos tão responsáveis
Por eternamente amar
Como somos, imperdoáveis,
Por não amar nunca, a par.
Começa
Sempre o amor é perecível,
Nasce e começa a morrer
Sem fronteira discernível:
Sempre início tem de ser.
Inquietude
A inquietude desconfiada
De não ser que baste amado
É a prova de começado
Ter o amor a caminhada.
Valor
Um homem, de apaixonado,
Importa-lhe lá saber
Que valor outrem há dado
À mulher a quem quiser!
Conseguir
Conseguir por piedade
É inútil, seja o que for,
Se o que quiser de verdade
O só quiser por amor.
Luar
Que lindo luar! A noite
Copia fiel as grevas
Com que vida além me afoite:
O amor no meio das trevas.
Coragem
Aquele que tem coragem
Para amar sem já tremer,
A coragem na viagem
Tem de ter para sofrer.
Único
Amor único e certeiro
É aquele que é consagrado
A tornar feliz, primeiro,
Aquele que for amado.
Entrar
Como o amor é a tentativa
De entrar no íntimo de alguém,
Só bem ocorre se activa
Do outro a rendição também.
Memória
Amamos e toda a glória
É pensar no que passou,
Cuidar no que se cuidou:
Amar é amar de memória.
Duas
Não, não volto a apaixonar-me,
Uma vez apaixonado.
Era duas almas dar-me
Num só tempo dum só fado.
Restrição
Que não haja restrição
A amor algum que não finja.
Porém, que o amor, então,
Tudo o mais a si restrinja.
Contar
Jurar um amor eterno
É não contar, num afã
De gesto em que tudo é terno,
Com o dia de amanhã.
Sabedoria
Sabedoria de amor
É aprender, no que é sofrido,
Por detrás de toda a dor,
O prazer nele contido.
Vista
Dar amor de olhos abertos
É vista ter dando amor.
De olhos fechados, mais certos,
É a vista nem ter de impor.
Muito
Muito pelo que muito ama
Quem sofrer rumo à vitória,
Nem já da chaga reclama,
A cruz dele é dele a glória.
Amante
Amante não é quem morre
Porque amou, senão quenquer
Que nem a morte socorre
Porque amou para morrer.
Souber
É de aprender diligente,
Senão perde-se o lugar.
Que importa amar fundamente
Se não se souber amar?
Honestidade
Uma honestidade nobre,
Porém que implacável for,
É uma bagagem bem pobre
Na moradia do amor.
Parar
Da vida no sobe e desce
Não há parar para ver.
Sempre o amor, sempre, decresce
Quando deixa de crescer.
Sexo
O amor acolhe a atracção
Dum sexo por outro sexo,
Porém concentrada então
Num só indivíduo conexo.
Filósofo
Amor, filósofo grande,
Agrada-lhe a solidão,
Desde que a solidão mande
O par que ele amar então.
Provém
Amar é necessidade
Que provém do coração.
Fazer amor então há-de
Ser somente ocupação.
Improcedente
Sempre o amor é improcedente
Quanto à pendência que aclamas:
Quando amas, não és prudente;
Quando és prudente, não amas.
Juntos
O amor mostra na verdade
Do inesperado o pendor:
Rir juntos capacidade
É, no fim, também de amor.
Reclama
Um amor, para durar
Na ternura que ele preza,
Reclama, em todo o lugar,
Que haja sempre uma incerteza.
Epidemia
O amor, como a epidemia,
Quanto mais nós o temamos
Na gesta do dia-a-dia,
Mais nós expostos lhe andamos.
Sacrifício
Para quem amar, ao ser,
É bem mais que fantasia
Que um sacrifício qualquer,
Qualquer um, é uma alegria.
Rápido
Mui facilmente enganar
Nós rápido nos deixamos,
Sem mesmo até reparar,
Por tudo aquilo que amamos.
Chego
Nós nunca amamos ninguém:
Não chego às profundidades
Que quenquer dentro em si tem,
Só a trilhos de qualidades.
Requerido
Requerido é rematar
Tanto amor em meu redor
Para ao fim poder chegar,
Até que enfim, ao amor!
Fricções
Para a relação ter óleo
Onde as fricções sejam calmas,
O amor quer o monopólio
Da faculdade das almas.
Vinho
O amor é, tal como o vinho,
A perigosa triaga
Que, bebida em desalinho,
Sempre ao fim nos embriaga.
Sofreis
Vós, que sofreis porque amais,
Nunca deixais de sofrer.
Amai então inda mais:
Morrei de amor, que é viver.
Melhor
É melhor ficar mui triste
Com amor que me atropele
Do que alegre (se isto existe),
Alegre de andar sem ele.
Esconder
Seja lá qual for a trinca
Que esconder que dou no figo,
Com um amor ninguém brinca,
Ninguém brinca sem castigo.
Faltava
Somente quando encontramos
O amor é que descobrimos
O que nos faltava aos ramos
Da vida que nós fruímos.
Existe
Que há-de ser amar alguém?
É logo reconhecer
Que existe alguém cá também
Como tu, como quenquer.
Gravetos
O amor é tal como o fogo,
Ao durar sem intervalo
Tenho aos gravetos de ir logo,
Que é preciso alimentá-lo.
Erro
O erro que nós cometemos
É procurar ser amados
Em vez de, no que operemos,
Ser, ao amar, aplicados.
Razões
Eu, se há razões, odiarei,
Se puder, o que me invade.
No inverso, até amarei,
Só que aqui, contra vontade.
Raro
Amar quem te odeia
É raro exequível.
Sem dum santo a veia?
Então é impossível.
Caça
No amor, sempre ilusionista,
Mais vale a caça que preza
Do que, depois morta à vista,
Por fim, a rendida presa.
Nunca
O amor faz-me quem eu sou
E mais sou sendo mais eu.
Aquele que nunca amou
Nunca deveras viveu.
Enfastia
O amante que andar distante
Torna mais quente o desejo.
Um hábito que se implante
Enfastia qualquer beijo.
Migalhas
Talvez o amor seja apenas,
Em quem amor não tiver,
Reconhecer as pequenas
Migalhas que dão prazer.
Livrar
Somente através do amor
O homem onde me ensimesmo
Se pode livrar de horror:
Libertar-se de si mesmo.
Carta
Nenhuma carta é mais fácil
Do que uma carta de amor:
Só o amor, flébil e grácil,
É preciso nela pôr.
Tempo
Na vida toda a questão
É arranjar ao tempo fugas.
Ora, importa é o coração:
O coração não tem rugas.
Construir
Amar, com todo o mistério,
É bem mais do que sentir,
É construir um império,
Que, fatal, amar é agir.
Cura
O milagre-mor do amor
Cura da galanteria:
Namoriscar todo o dia
Acaba dele ao calor.
Mais
Podemos amar alguém
Mais que qualquer outro empenho,
Porém nem tento também,
Que às freimas me nem atenho.
Pequena
Não é, não, na gesta grande,
É na que pequena for
Que mostrar devo o que mande
A mão grande em nosso amor.
Enche
O amor, quanto mais gratuito,
Mais nos enche a caminhada:
Pouco com amor é muito
E tudo, sem amor, nada.
Escolha
Quem amar aceita
A escolha do amor,
Por maior a dor
Que traga a colheita.
Venha
O amor não é para ser
Julgado mas sim vivido,
Venha lá donde vier,
Vá onde for seu sentido.
Horas
Amar será sempre estar:
Nas horas desprotegidas,
Quem amamos ao buscar,
Ei-lo ali pronto às surtidas.
Requeiro-te
O amor é a melhor maneira
De comigo me encontrar:
Requeiro-te à minha beira
Para a mim me decifrar.
Longe
Bem mais longe a ti te atinges
Quando me tu amas a mim.
Mais longe, que não me infringes,
Em mim vou se te amo assim.
Rir
Saber amar é também
Muito, muito saber rir:
Ainda juntos vamos bem
De rirmos até cair.
Grande
Grande amor é o que resiste
Aos nadas que de cotio
O impedem (mas ele insiste!)
De crescer ao desafio.
Servem
As coisas não valem nada,
Porém significam tanto
Quando me servem, de entrada,
Para amar mais, entretanto!
Salva-me
Salva-me, seja o que for
Que haja em minha perdição:
Ou é salvação o amor
Ou não terá salvação.
Embora
Digam embora o contrário,
O amor do corpo precisa,
Nem que seja o braço vário
Onde agarrar uma brisa.
Medo
Toda a alegria contém
Um pedacinho de medo:
O medo que me retém
De te não ter. Credo! Credo!
Respirar
Não vou de ti precisar
Para eu respirar, não.
Preciso para ficar
Mas é sem respiração.
Romper
Amar é romper os credos
Dos medos de quem amamos
E guardar disto os segredos
Que com outrem partilhamos.
Curta
A vida é curta demais
Para perder tempo e suor
Com o que nem dê sinais
De envolver por fim amor.
Oferece
O amor existe só quando
Oferece, pelo menos,
Um segundo ou outro brando
De nós próprios nos acenos.
Fugir
Quem não tem a quem ele ama
Tende a encontrar, nas lesões,
Ao compensar pela rama,
Bizarras ocupações.
Logra
Só quem de si for inteiro
Logra ser, sem ser à toa,
Quem por inteiro é primeiro
Alguém que é doutra pessoa.
Contraste
Que é que morrerá primeiro
No contraste dos sinais
Contra um amor verdadeiro:
Não amar, amar demais?...
Resistir
O amor é tão frágil
Que logra, desnudo,
Modelando-se ágil,
Resistir a tudo.
Degraus
O amor, no rumo pioneiro,
Por degraus eleva os laços.
Importa amar por inteiro
Mas cada dia aos pedaços.
Lógica
O amor na razão tropeça,
Em lógica que o resuma.
Quem amar com a cabeça
Não ama coisa nenhuma.
Sofrimento
Amar é sempre saber
Que o sofrimento vivido
Afinal pode fazer,
Pode, deveras, sentido.
Trate
O amor, acaso nos morda
Ou nos trate a pontapés,
É que o amor nos acorda
Sempre da primeira vez.
Resiste
Por mais que se defenda,
Nenhuma relação
Resiste sem contenda,
Resiste à perfeição.
Redor
Um amor jamais existe
Se antes e após, mesmo amável,
Tudo o que em redor lá viste
Se mantiver imutável.
Redondamente
Quem não for pretensioso
Quando seu amor proclama,
É que, afinal, mentiroso,
Redondamente não ama.
Esvai-se
Sem amor, uma pessoa
Esvai-se, trémula espuma.
Por mais que no mais for boa,
Não é pessoa nenhuma.
Serve
O amor serve para tudo,
Excepto neste momento
De o trair e calar mudo:
Receber em pagamento.
Segura
O que segura o amor,
Tudo após bem ponderado,
De conversar é o pendor
Sobre tudo o vivenciado.
Lavram
A verdadeira união
Não é de dois que se adoram
Mas dos que lavram o chão
Que mutuamente se exploram.
Desencontradas
Por mais que a vida bulir
Em desencontradas tramas,
Nunca deixes tu partir,
Nunca, aqueles a quem amas.
Sair
Para sair dum lugar,
Só se sairmos de nós.
Sair de nós, só se amar
Alguém deveras após.
Profundamente
Ser profundamente amado
Dá força para a viagem.
Amar alguém, doutro lado,
Para tal dá-nos coragem.
Quando
Quando alguém gosta de alguém,
Gosta apesar de haver falhas;
Quando alguém ama, porém,
Com falhas o ama: são gralhas...
Exulta
Amor que constantemente
Não exulta em grito louco
Então morre fatalmente,
Fatalmente, pouco a pouco.
Par
Escolhe o par com cuidado:
A partir da decisão
Ou ser feliz será um dado
Ou tormentos vingarão.
Viveu
Só viveu a solidão
Da vida como da morte
Quem viver escolhe o vão
Sem amor para seu norte.
Feridas
Ninguém atingiu o céu
Sem feridas que repiso.
Ninguém lhe entra e rasga o véu
Sem um rasgado sorriso.
Sério
Vida a sério, só de amor,
Que amor é seriedade.
Desta verdade ao calor
É o amor a intensidade.
Sorri
A mulher que sorri terna
No vazio dos abraços
Dos braços já sem lanterna
Ao amor sorri nos braços.
Panteras
Se as minhas mãos se cravaram
Num amor a palpitar...
Quantas panteras mataram
Só do gosto de matar!
Maior
Quanto maior for
Mais se lhe resiste,
Todo o grande amor
Sempre é alegre e triste.
Corpo
Nenhum corpo de mulher
É tão corpo de rainha
Que de vez o vá poder
Amar da fome que tinha.
Só
Quando há deveras amor,
Então já ninguém conversa,
Amamos e com vigor.
Fala? Só se sentir versa.
Pede
O amor pede a identidade
Com a diferenciação.
É uma impossibilidade
Num mundo tão parco em chão.
Plintos
Não mora o amor nos sujeitos,
Nem no amante nem no amado,
Mas nos modos, plintos feitos
Para assaltar o outro lado.
Convicções
As convicções que tu prezes
Muitas vezes se consomem:
O amor é mais forte às vezes
Do que as convicções dum homem.
Soltos
Sonhamos amar,
Soltos na magia.
Amar e sonhar
Doce é bigamia.
Melhor
Seja todavia amor
Consumido dia adiante,
O amor jamais é melhor
Do que é melhor ser amante.
Erva
Quando eu falo de amor,
Até a erva me escuta
E não passa de recruta
Esta fala sem sabor.
Fosso
O fosso entre compaixão
E entrega sem nada impor
É a mais escura região,
A mais profunda do amor.
Cumprir
Amar é cumprir a vida
Com sentido e com valor,
Com a força que, vivida,
A leve a viver melhor.
Solidão
Sofrer uma solidão
Tem sentido radical
Num peito aberto, afinal:
Pois só aberto ele ama então.
Muro
Separados em maranhos
Por um muro todo nu,
Todos me são mesmo estranhos
Menos tu, sim, menos tu.
Amores
Nos amores deste mundo,
Um ama e o outro, a par,
Leva a vida mui jucundo
Com só se deixar amar.
Acompanhar
O amor é uma companhia
De acompanhar pela rama,
Pois nunca acompanharia
Como quenquer que a gente ama.
Mentira
Num amor, uma mentira
Não é mais de recear
Para o que a diz, dela aufira,
- Só se a não acreditar.
Agradável
Mentira de quem amamos
É agradável benefício,
Sem duma sombra resquício,
Nela enquanto acreditamos.
Primeira
A primeira grã ventura
Que o amor dá, constatamos,
O aperto da mão segura
É daquela a quem amamos.
Cedo
Amem cedo, se quiserem
Amar tarde, que o reverso
De à morte sobreviverem
É um amor que vem do berço.
Juramentos
Juramentos, moeda falsa
Com que se pagam, gostosos,
(Já que a factura a tanto alça)
Sacrifícios amorosos.
Velhice
Na velhice dum amor,
Se o deixo murchar da idade,
Vivemos o mal pior
E o prazer é nulidade.
Dói
Pelas pessoas que amamos
Dói menos ser enganados,
Quando de dor nos rasgamos,
Do que ser desenganados.
Difíceis
Difíceis de contentar
Num grande amor incomum
Somos como quando, a par,
Não temos amor nenhum.
Acreditamos
Se acreditamos amar
A amada por amor dela,
Andamo-nos a enganar,
É por nós toda a sequela.
Culpa
Não se aperceber do instante
Em que se apagou a chama
Dum amor dali em diante
É da ilusão de quem ama.
Romper
O amor tanto vai prender
Entre nós todos os ramos
Que o custa tanto romper
Quando nós já não amamos!
Engano
Quase sempre o engano vai
Mais longe no amor que alcança
(E que nem crê que se esvai)
Do que vai a desconfiança.
Perto
Mais perto andamos de amar
Quem nos odeia que aqueles
Que nos amam quando, a par,
Demais amarem imbeles.
Deixámos
É impossível lá voltar
Por uma segunda vez
A quem deixámos de amar
Num verdadeiro revés.
Grande
Quando puderes dizer
O teu grande, grande amor,
Traído em fala o vigor,
Deixa o grande amor de o ser.
Esperta
Para a rapariga esperta
Os homens não são problema,
São a saída ao dilema,
A resposta descoberta.
Botão
O amor, se é de fogo hiante,
Só de alto espírito o acartas.
O botão que é mais fragrante
Abriga às vezes lagartas.
Campo
Campo embora de disputa
E por toda a eternidade,
Com um amor ninguém luta,
Que é lutar na vacuidade.
Contra
Um amor, quando ele existe
Com todas as competências,
Reage contra o que aviste
Que são só conveniências.
Licor
O amor é como o licor,
Quanto menos se exalar
Mais força adquire em teor,
Melhor para degustar.
Moderação
Ter moderação em mente
Se é da virtude o sufrágio,
Amar moderadamente
Do medíocre é apanágio.
Vasta
Tanto o amor é ocupação
Vasta que o bem sucedido
Não devia ter à mão
Outra mais, nem no sentido.
Nunca
Um homem nunca tem porto,
O tempo nunca tem praias:
Corre e passamos. Um horto?
Só o amor até às raias.
Difícil
Difícil satisfazer
É um homem quase igualmente
Quando muito amar quenquer
Ou pouco amar, o imo ausente.
Mais
Para quem ama ou não ama,
Seja lá ele quem for,
Muito mais que a própria fama,
O amor que tudo é maior.
Norte
O amor sempre há norteado
Muita vida com magia,
Mas tem sempre o norte ao lado
Quem tiver o amor por guia.
Diferença
O amor é o grande exagero
Da diferença que achais
Entre um indivíduo mero
E, ao lado, todos os mais.
Grau
Arte de amar é, por vezes,
Exactamente dizer
O que o grau de embriagueses
De momento nos requer.
Primeiro
É sempre o primeiro amor
Uma pequena loucura
E a curiosidade-mor
Do mistério da procura.
Único
É o amor único bem
Deste mundo que não quer
Mais comprador para além
De a si próprio se querer.
Raios
Na cumeeira que assumes
Os raios são vigorosos:
Num amor todos os cumes
São sempre tempestuosos.
Fé
De pouco vale estudar
Se é só perder paciência
No que é sempre singular:
O amor é fé, não ciência.
Nega-o
Um homem enamorado
Que não é correspondido
Esconde-o por todo o lado,
Nega-o sempre, de perdido.
Recusa
Mesmo dando em pedro-sem,
Quem lhe recusa a pendência?
O amor não combina bem
Nunca com inteligência.
Censura
A mulher apaixonada
Só da própria consciência
Acolhe a censura dada,
Mesmo assim com reticência.
Mistério
Tem a vida algum encanto
Sem o amor, este invisível
Mistério que, mais que um manto,
Nos cerca de indescritível?
Sucumbe
Nas lições de abismo
Sucumbe o pudor
Sempre ao despotismo
Do tirano amor.
Logro
Como há fé nele investida,
Num amor o logro alcança,
Na crença desprevenida,
Mais longe que a desconfiança.
Verdadeiro
Da duração o teor
É que o mesmo outro virou.
Se houver verdadeiro amor,
Vira o amor, nunca findou.
Impõe
Um amor sempre nos mente
Se a razão lhe impuser pausa.
Amo verdadeiramente
Apenas se amar sem causa.
Conquistada
Quando tivermos em vista
Mais longe ir nalgum reforço:
Amamos mais a conquista
Conquistada com esforço.
Muitos
Há muito remédio
Para o amor curar,
De nenhum o assédio
É eficaz, a par.
Casada
O amor da mulher casada
Sempre é o mais digno do mundo,
Embora os casais, de entrada,
Nem saibam disso um segundo.
Rir
O primeiro amor parece
Ser eterno quando chega.
Mais nos faz rir quando esquece,
Morto o fogo que nos pega.
Amamo-nos
Amamo-nos sobretudo
E aos demais todos após,
Vendo quanto ali me iludo,
Sempre por amor de nós.
Muda
Amores? São sempre eternos.
Mesmo num amor à toa,
Mal brotem os gestos ternos
O que muda é a pessoa.
Potente
Mais potente contra o amor
Não há nada de excelência
Que lhe possa contrapor
Senão a própria impotência.
Nunca
É bem melhor ter amado
E ter perdido a jogada
Que, por nunca ter jogado,
Nunca ter perdido nada.
Piedade
Fazer-se amar por piedade
Quando o amor é admiração
É escolha que nos invade
De lástima o coração.
Esforço
Amor é esforço dum homem
A contentar-se e conter,
Entre os que tudo consomem,
Com a única mulher.
Incenso
O amor dum homem é incenso
Que escorre para o chão charro
Quando o ídolo em que penso
Ídolo é mas só de barro.
Ridículo
Um amoroso se empenha
Em mais amar que o possível.
Eis a razão porque tenha
De ridículo o risível.
Toda
Pretender que uma mulher
Ame toda, toda a vida
É a Primavera querer
Todo o ano florescida.
Maneiras
Mil maneiras de perder
Há o amor duma mulher.
Pois a que se não previu
Foi mesmo a que aconteceu.
Metade
Aquele que nunca amou
Apaixonado, a evidência
É que a metade ignorou
Mais formosa da existência.
Passageira
É o amor insanidade
Passageira, de momento,
Curável na realidade
Do que for o casamento.
Cego
Quando ele me invade
Com olhar de louco,
O amor sem verdade,
Cego, dura pouco.
Bondade
Quando não é perturbado
Da necessidade ao trato,
O amor é muito mais grato
Só da bondade gerado.
Maior
Da vida, no que tiver
De melhor e mais visível,
O amor é o maior prazer
Que ao homem for acessível.
Condiciona
Condiciona a cor
Que cada qual sente
Atenção de amor
Reciprocamente.
Poucos
Deveras se um só momento
Da vida que hajam vivido
Alguns poucos hão querido,
Do amor foi pelo fermento.
Infâmias
Façam lá quanto fizerem,
Fora a infâmias que vos tramam:
Destruam as que vos ferem
E amem sempre os que vos amam!
Contradição
No amor sempre há-de aflorar
A contradição que houver:
Não deve apenas queimar
O amor, também aquecer.
Saboreiem
Do amor saboreiem tudo
O que o sóbrio saboreia,
Não se embebedem, contudo,
Que o pé se atola na areia.
Insistir
Quando o amor é uma insistência
Que de insistir só traz dor,
Toma o fármaco de ausência,
Uma ausência cura o amor.
Desculpa
É o amor uma empreitada
A que inteiro ao fim me grudo.
O amor não desculpa nada
Ou então desculpa tudo.
Sem
Sem amor como há-de ser
O ser de quenquer que for,
Já que viver sem amor
É, no valor, não viver?
Vivo
O mais verdadeiro,
O mais vivo amor
É o de que me abeiro
Sem o nem supor.
Fora
Tu, se amas, perdoa,
Que o amor merece.
Se não amas, voa
Para fora, esquece.
Inspira
A mulher resiste
Ao amor que sente?
Não resiste, insiste
No que inspira em frente.
Doutro
Nós amamos com amor
Aqueles que doutro modo
Não nos podemos propor
Amar, ao amar de todo.
Quase
Quase tudo quem existe
Vive apenas meio fado
E ao outro meio resiste:
Ama só porque é amado.
Menos
Menos maneiras de amar
Há que aquilo que se diz
E mais do que imaginar
Pode alguém que ao amor quis.
Única
Num amor a economia
De sentimento e prazer,
Única a que amor tendia,
Do íntimo sempre há-de ser.
Sobretudo
Amar, sim. Amar, porém,
Tem muito que se dizer:
Não é apenas amar bem,
É também compreender.
Pára
Ódio não pára com ódio
Nunca, na humana caverna.
Ódio do amor só no bródio
Pára, dele a fenda eterna.
Agrado
Tão do agrado é ser amado
Que até, com toda a evidência,
Nos contentamos do fado
De o viver numa aparência.
Tanto
Tanto amei e fui amado!
Tanto basta, se afigura,
Para me selar o fado
A selar na sepultura.
Traz
Quando o amor excede,
Não traz aos que ilude
E que já nem mede,
Honra nem virtude.
Queima
Amor que se acende e apaga
Descontinuadamente
Logo se queima na fraga
Que nos esmaga o presente.
Esquece
Dum homem que já não ame
Esquece a mulher de vez,
Trame ele o que quer que trame,
Qualquer favor que ele fez.
Rever-me
Ao rever-me, muitas vezes,
Já comigo em desunião,
Vêm à tona os reveses,
Do amor é a separação.
Reviravolta
Para o amor quem se adestre
A reviravolta fez:
Um amor é um grande mestre,
Ensina tudo de vez.
Lado
A viver do mundo ao lado,
Só quem não ama, ao presente.
O amor é estar preocupado
Com o outro infinitamente.
Limpo
Quando a vida for problema,
Resistir bem, ser paciente,
No céu logo escreve o lema:
Fica limpo de repente.
Perca
Os amanhãs radiosos
Não perca que inda nem viu,
Agarrado aos tenebrosos
Ontens de quanto morreu.
Estrangula
Repara bem no circuito
Que te estrangula adiante:
Para quem não quiser muito
O que tiver é o bastante.
Cai
O amor, comunhão de seres,
Cai ao acaso dos céus.
Ama, pois, quem tu quiseres,
Mas casa-te com os teus.
Remédio
O remédio radical
Para a doença e a morte
É nunca, a nenhum sinal,
Nos deixar vencer da sorte.
Mantém
Mantém em teu coração
Verde árvore que ali plante
E talvez te chegue então
A cotovia que cante.
Adeus
Um adeus entre quem se ama
É uma tão doce tristeza
Que deve durar-lhe a trama
Até das manhãs à reza.
Ruína
Ofereçam-lhe grinaldas
De César à vã vaidade,
Como a um deus beijem-lhe as fraldas,
Logo a ruína enterrá-lo há-de.
Úteis
Para quê lembrar os mortos
Se úteis nós lhes não pudermos
Ser de algum modo, os confortos
Entre aquém e além tecermos?
Agarrar
Se a criança de repente
A ti se põe a agarrar,
É que não tem, geralmente,
Ninguém em quem confiar.
Lado
A vida passamos todos
Vivendo o lado perdido
De nós mesmos cujos modos
Podíamos nós ter tido.
Velhice
Velhice com coração
É daqueles que, atilados,
Aprenderam a lição:
- Como amar e ser amados?
Mantém-te
Mantém-te na companhia
Daqueles de quem tu gostas
E que gostam todo o dia
De ti sem te virar costas.