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um número aleatório entre 393 e 463 inclusive.
Descubra
o poema correspondente como uma mensagem particular para o seu dia de hoje.
393 – Ao mar fundo que me
eleve
Ao mar fundo que me eleve
Canto aqui regularmente
Na comum métrica breve,
No espelho que o povo teve
Pelos tempos fora em mente.
Canto o sonho e a utopia,
O que ao píncaro trepar,
Tendo as estrelas por guia,
E o que aos fundos mergulhar
Por mim dentro, nas cavernas
Tacteando a escuridão,
Pelas funduras eternas
Donde sempre chispa a luz
Que a luz do dia produz.
394 – Jogo |
|
A vida é um jogo de dados, |
O deus em que eu acredito |
Fá-los rolar: são os fados, |
O destino de meu fito. |
|
Ora, este acaso é uma bênção, |
Única minha esperança |
De que a transpor me convençam |
As portas onde me lança. |
|
Abre a possibilidades |
Que nunca imaginaríamos |
Sozinhos: nossas herdades |
Aos vizinhos fecharíamos. |
|
Quando atendo o inesperado |
Um novo mundo me é dado. |
|
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395 – Decisão |
|
Toda a espera dói |
Como dói esquecer. |
Porém não saber |
Que decisão foi |
De tomar no evento |
É que é sofrimento: |
|
Tendo a vida diante, |
Que é que ma garante? |
|
|
396 – Sonhos |
|
Segue teus sonhos, transforma |
Tua vida num caminho |
Que a Deus vá, de qualquer forma: |
Cura com o teu carinho, |
Teus milagres realiza, |
Profetiza, profetiza, |
|
E ouve teu anjo da guarda: |
- Muda-te no que te aguarda! |
|
Sê guerreiro deste embate |
E feliz no teu combate! |
|
Depois olha o sofrimento: |
Hora de transformação |
É dos mártires momento. |
Antes que o sonho dê pão, |
Sacrifica tantos, tantos, |
Ridículos, pelos cantos! |
|
Sendo acabam perseguidos, |
Por loucos a serem tidos, |
|
Tentativa milenar |
Para os desacreditar. |
|
Mas quem morre na fogueira |
Ou nas arenas das feras |
A porta da glória inteira |
Franqueia sem mais esperas. |
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397 – Alpinista |
|
O alpinista aventureiro |
É que sabe qual é a graça, |
Ele é que foi o primeiro |
No caminho que ameaça. |
|
Uns nem chegam a metade, |
Outros morreram nas fendas, |
Um os dedos persuade |
A cortar, mortos, nas tendas… |
|
Um dia, porém, chegou |
Alguém ao cimo dos picos, |
Ele foi que se alegrou |
Do imenso com os salpicos. |
|
“Não há nada, só paisagem!” |
- Cuidam os de cá de baixo. |
“Há o desafio e a viagem, |
A pedra nova que encaixo, |
|
Nenhum dia a outro igual |
E cada manhã que augura |
Um milagre especial |
Num mundo que se inaugura…” |
|
- E o primeiro que trepou, |
Olhando as casas-migalha |
Na lonjura que as tragou, |
Outro sentimento espalha: |
|
“O dia deles, que igual! |
Que graça vai ter aquilo?” |
A sério Vida, afinal, |
Só no seu rumo intranquilo. |
|
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398 – Realidade |
|
Quem a realidade de hoje |
Cuida ser a verdadeira |
Sustém-se mas ela foge, |
No vácuo o lança, ligeira, |
|
Que a de hoje vem destinada |
A revelar-se amanhã |
Como ilusão acabada. |
E a vida não conclui, chã, |
|
Nunca, nunca, a caminhada. |
Jamais pode concluir, |
Que, se a conclui, de assentada, |
Findou de vez o porvir. |
|
|
399 – Longe |
|
Quão mais longe nas sondagens, |
Mais longe o fundo do poço. |
À medida que as viagens |
Novas metas, troço a troço, |
Vão descobrindo em apoio, |
Mais longe importa levar |
A sonda por cada arroio, |
Mais e mais a aprofundar. |
|
Como se quanto encontramos |
De investigável nos fora |
Proposto em todos os ramos |
A zombar a toda a hora |
|
Da laboriosa pesquisa. |
Somos o navegador |
Pela longa costa à brisa |
Sem se poder antepor |
|
Nunca o termo da viagem. |
Após cada descoberta |
Avista, em meio à triagem, |
O apelo dum novo alerta, |
|
Por detrás dum promontório, |
Um outro logo a seguir, |
Os longes, premonitório, |
Sempre a obrigá-lo a cobrir. |
|
- Somos infinitamente |
Toda a infinidade ausente. |
|
|
400 – Ante |
|
Ante o Senhor sou o tolo |
Para poder ir pisar, |
Sem o saber, o lugar |
Ponto de união, o solo |
|
Que funde a Terra e o Céu, |
Durante o sono acolher |
Os avisos, sob o véu, |
Que me permitam rever |
|
Os sonhos mais as visões |
- E seguir as instruções! |
|
|
401 – Cantar |
|
Cantar mas com sentimento, |
Deixando-se ir, se perdendo |
Na cantiga até o momento |
De ser ela a já se ir vendo, |
Esta deveras é via |
De atingir sabedoria. |
|
Rodopiar, sapatear, |
Ir-se movendo a figura |
Sem o ritmo dissipar, |
Ignorando-se na altura, |
Eis como a dança nos dança, |
Que dentro enfim nos alcança. |
|
Tu não és tu, nem eu, eu, |
Mas somos os outros todos, |
A prisão do corpo abriu, |
Somos um de muitos modos. |
Visitas teu animal, |
Descobres, fazes-te igual. |
|
Quem não dorme o pensamento, |
Dele próprio já esquecido, |
Nas vaidades não tem tento, |
Não devém o canto ouvido, |
Nem é dança quando dança, |
Nem outrem ser nunca alcança. |
|
Então não sai da prisão, |
Não viaja, não visita |
O animal sob o torrão, |
Não trepa ao cume que excita. |
Não vive nunca em seu horto, |
Decadente, é um vivo-morto. |
|
|
402 – Espaço |
|
O espaço não tem limites, |
Além se abre ao infinito. |
Nada valem meus palpites |
Quando olho este imenso, aflito. |
|
Vivo em Planeta de nada |
Duma Estrela bem menor, |
Aqui na borda gelada |
De Galáxia de estupor. |
|
Pouco vivo e logo esqueço |
E mesmo a Galáxia morre… |
- Só tem sentido o que meço |
De útil no que de mim corre. |
|
|
403 – Mistério |
|
O mistério é o de exprimir |
Como o espírito devém |
Matéria rumo ao porvir, |
Como o pó condensa e tem |
Mente que nele eu encorpo: |
Como é que alma se faz corpo. |
|
|
404 – Quanto |
|
Um homem é desconforme |
Por tudo quanto é por dentro, |
Ele e os mortos, todo informe, |
Desmedido se nele entro. |
|
Nele encerra a vastidão, |
A vastidão do Universo. |
Somos fantasmas no chão, |
Densos no íntimo reverso. |
|
E aquilo que construímos, |
Desde o sertão à Sibéria, |
Não cabe, que as explodimos, |
Nas paredes da matéria. |
|
|
405 – Real |
|
O real, a realidade |
Não é uma objectividade, |
Há-de ser sempre uma ideia |
(Convicção corpo tomando) |
Que se faz carne e a permeia, |
No palpável realizando, |
Lento e lento mais visível, |
O sonho sempre impossível. |
|
|
406 – Paraíso |
|
Qualquer igreja receia |
Céu na terra realizar: |
O paraíso só ameia, |
Para o Fim sempre adiar, |
|
É para ser com demora, |
De forma nenhuma agora. |
|
Nunca se trata da terra, |
- Por isso é que o céu emperra. |
|
|
407 - Gerar |
|
Aos povos mais que aos governos |
Cabe gerar a utopia, |
Terra do futuro, ternos, |
|
Na do presente, hoje em dia, |
Transmudarem, criadores. |
Aos povos competiria |
|
A epopeia dos maiores |
Da contínua mutação |
Do mundo em campo de flores. |
|
Os povos tal criação |
Hão-de assumir, na alegria, |
Sonho e determinação, |
|
Com humildade por guia, |
Da esperança na fundura |
Onde o entusiasmo arderia, |
|
Tudo em banho de ternura. |
Aos povos mais que aos governos |
Cabe coser a costura |
|
De bens temporais a eternos. |
|
|
408 – Fautor |
|
Se não for eu o profeta |
Fautor de libertação |
Duma Terra cuja meta |
À violência é pôr travão, |
|
Que por liberdade clama, |
Logo o Deus da criação |
Os vai suscitar na chama |
Mesmo das pedras do chão. |
|
É que ele nunca desiste |
De salvar (eterna guerra |
Em que eternamente insiste) |
|
E de libertar a Terra. |
|
|
409 – Larguem |
|
Larguem os templos, penetrem |
No mundo inteiro e na História, |
Diálogo, esforços perpetrem |
Com os mais, rumo à vitória! |
|
E libertai-vos do medo |
Que os deuses leva a inventar |
Que vos devoram num credo |
O sangue e a carteira a par! |
|
Entregai-vos num só povo, |
De alma inteira e coração, |
Aos trabalhos de renovo |
Que o mundo transformarão, |
|
Para que deixe de inferno |
Ser algum dia de vez |
Das maiorias que eterno |
Exclui do humano entremez! |
|
Audácia de erradicar |
Liberal economia, |
Do deus-dinheiro um altar |
Que exclui, mata a maioria. |
|
Trocá-la por solidária |
Economia fraterna |
Que tem por meta primária, |
A toda a vida que hiberna, |
|
Libertá-la em mil renovos |
Nos sujeitos e nos povos. |
410 – Jesus |
|
O Jesus de Nazaré |
Não é de nenhuma igreja, |
Por mais que de boa fé |
Reivindiquem que ele o seja. |
|
Jesus é da humanidade, |
Dela acaso o melhor fruto, |
Ser humano em realidade |
Onde os mais têm o produto. |
|
Ateus e crentes os olhos |
Nele poderemos ter |
Para, entre as marés e os escolhos, |
Irmos aprendendo a ser. |
|
|
411 – Liberte |
|
Ordem nova mundial |
Económica e política |
Que liberte, espiritual, |
De hoje a alienação raquítica |
|
Que oprime povos inteiros, |
Continentes, como classes, |
Proporcione viveiros |
De virentes interfaces |
|
De vida comunitária, |
De fartura e qualidade |
- Eis a utopia sumária, |
Nunca mais realidade. |
|
Dos povos como pastores |
Que os dirigentes se portem, |
Da libertação mentores |
A pascigos que os exortem, |
|
Não mais como mercenários, |
Menos ainda como lobos!… |
- Que sonhos tão perdulários |
Na infinda corte de bobos! |
|
|
412 – Ventre |
|
No fundo ventre da História |
Há um mundo outro em gestação |
Da quimera sem vitória |
Mas sempre em fermentação. |
|
Ninguém dono de ninguém, |
Nem da riqueza gerada |
Doutrem no labor que tem, |
Nem de Deus apropriada |
|
Ser a imagem por quenquer, |
Jamais alguém ser senhor |
Nem dum povo nem sequer |
De alguém que o deseje um ror… |
|
- Sabemos que é uma quimera, |
Todavia, que bom era! |
|
|
413 – Porta |
|
Entrar pela porta estreita |
É ser do jeito de Deus: |
Quem se dá gratuito e aceita |
Os mais, alheios ou seus, |
|
Quem vive de porta aberta |
E coração disponível, |
Quem como irmão se desperta |
Universal e credível… |
|
- Quem ama os demais na trama |
Com que Deus, enfim, nos ama. |
|
|
414 – Riqueza |
|
Que a política organize |
O mundo numa família, |
Que a produção nos deslize, |
Riqueza duma vigília, |
|
Toda ao serviço da vida |
De todos por todo o lado, |
Do país que até se olvida, |
Do continente ignorado. |
|
Que o Espírito que inova |
Seja a Política à prova. |
|
|
415 – Reinventar |
|
É preciso urgentemente |
Reinventar a política |
Como espiritualidade: |
Arte de ter tudo em mente, |
Com bem depurada crítica; |
Em conjunto a realidade |
Organizarmos da Terra |
No Cosmos que nos encerra. |
|
A ver se chega a ocorrer |
Um pouco do paraíso |
Que Deus sempre sonhou ser |
Nosso destino preciso. |
|
|
416 – Invés |
|
Ao invés da religião, |
A Terra, jamais o Céu, |
É que é de nossa missão. |
|
Uma Terra que nasceu |
Para ser um paraíso |
Que jamais aconteceu. |
|
Que é o que no futuro viso, |
Amassado no suor, |
Em lágrimas e juízo, |
|
Com disparate e pavor, |
Com equívocos e erros, |
Infantilismos e amor. |
|
À custa de pôr-me a ferros, |
De meu arbítrio senhor, |
A cavar livres aterros. |
|
|
417 – Tendência |
|
Cada povo, bem contrário |
Ao que pretende a política, |
Por tendência é solidário, |
Não é uma tribo somítica. |
|
É povo com Deus por dentro, |
Deus que da fecundidade |
(Quão mais pelos mais eu entro |
Em solidariedade) |
|
Fez bandeira fraternal |
Dum lar que gero mundial. |
|
|
418 – Medo |
|
Leva o medo à religião. |
O caminho alternativo |
É a abertura ao outro-irmão, |
Um sujeito, um povo esquivo, |
|
De mim diversos, de nós, |
Para com todos nos pormos |
Mesa comum a atar nós. |
E assim nós nos predispormos |
|
A acolher o Outro total |
Que surpreende, ladrão, |
E a quem damos, por sinal, |
O nome de Deus mais chão. |
|
|
419 – Conto |
|
Que é que é um conto de encantar? |
Todo um mundo onde acontece |
Tudo quanto eu desejar, |
Onde vou realizar |
Todo o Ser que me apetece. |
|
Num conto de encantar crio |
Um mundo que criaria |
Se o pudera, fio a fio. |
Sonho e romance atavio |
E, quando o mal lá se enfia, |
|
O melhor que o conto tem |
É que acaba sempre em bem. |
|
|
420 – Partir |
|
Partir, partir é uma festa |
Única talvez sob mil |
Formas que o acaso apresta. |
Dos horizontes de anil |
|
Eternos reféns, terão |
Os homens alguma vez |
Outra coisa celebrado |
Que a partida deste chão |
Rumo à lonjura das fés |
Daquilo em que hão apostado? |
|
|
421 – Entranhas |
|
Das entranhas da mulher |
Às duma comunidade |
Não há gestação qualquer, |
Nascimento que nos grade. |
|
O itinerário requer |
Vinte anos de viagem lenta |
Que em redor de si quenquer |
A se inventar implementa. |
|
Com paciência gero e escalo |
Do mundo o profundo abalo. |
|
|
422 – Professo |
|
Professo as religiões |
Todas, todas e nenhuma. |
Ensinaram-nos papões, |
Que devo prender-me a uma, |
|
Como a uma raça, a uma tribo. |
Verdade é que nos mentiram: |
Em todas há o mesmo cibo, |
Importa é se se extraíram |
As cascas ao tegumento |
Donde o sabor irradia, |
Da luz eterna fermento |
A alimentar a alegria. |
|
Quem trepar a minha senda |
Pode invocar Cristo, Buda, |
Maomé dentro da tenda, |
Ou Deus nenhum que lhe acuda. |
|
No templo que eu erigir, |
Cada qual, sua oração, |
E, se nenhuma surgir, |
Acolhe-se um coração. |
|
Respeito todas as crenças, |
Este é o meu crime fatal. |
Cristão quer que te convenças |
Do budista a dizer mal, |
|
O muçulmano ao judeu |
Crê que figura o diabo |
E as vítimas do escarcéu |
Revidam, ao fim e ao cabo. |
|
Nenhum quer ouvir o bem |
Que afirmo de qualquer deles, |
Só amaldiçoar convém |
Desde que dos mais às peles. |
|
O rebanho dos fiéis |
É de ódio, não é de amor, |
Apenas irmãos nas leis |
De interditos de furor. |
|
O meu crime é de querer |
A todos conciliar. |
E unem-se um dia qualquer |
Mil fés a me condenar. |
|
Mas, quando fartos de ritos |
E de tanta maldição, |
Dos mitos e dos conflitos, |
Hão-de recordar-se então |
|
Que um dia, pelo deserto, |
Um mortal humilde, aflito, |
Fez ecoar, bem desperto, |
Mundo além todo este grito. |
|
|
423 – Fim |
|
Vai um homem caminhando |
Sem saber o que o espera |
No fim do que vai andando. |
|
Em miúdo a questão era |
Que ninguém era capaz |
Coisa alguma, uma quimera, |
De lhe ensinar, eficaz. |
Quando já não é miúdo, |
Já nada, que tanto faz, |
|
Há que aprender, sobretudo. |
Apenas é para a frente |
Continuar ao que acudo |
|
Persistente, persistente. |
- E atrás nunca, andando mudo, |
Nunca olhar nem ter em mente. |
|
|
424 – Procura |
|
Quando ando à procura de algo |
Todo o caminho reveste, |
Degrau a degrau que galgo, |
O peso do que se investe |
|
E que ele em si nunca tem. |
Um homem nunca consegue |
Descobrir o que o retém |
Ou empurra ao que persegue. |
|
E, algum tempo decorrido, |
Todo o peso se há esvaído. |
|
|
425 – Viagem |
|
Para a viagem levamos |
Connosco aqui quase tudo, |
Mas a revolta deixamos |
E a indignação, sobretudo, |
|
Que deliberadamente |
Ficam em casa esquecidas. |
Vemos tudo o que se sente, |
Ouvimos lendas feridas |
|
E o que tanto maravilha |
É tudo, mesmo o medonho, |
Só porque tudo perfilha |
A novidade do sonho. |
|
O viajante perfeito |
Muda o coração e o jeito. |
|
|
426 – Rumo |
|
Somos este capitão |
Que a cada instante demarca |
Rumo fixo e posição, |
Cumpre a rota marca a marca |
|
Com um rigor implacável |
Até ao porto de abrigo. |
Mas ignora, indecifrável, |
Porque segue (porque sigo) |
|
Na esteira deste objectivo… |
- Só sei que é manter-me vivo. |
|
|
427 – Botas |
|
São botas de correr mundo |
Enfeitadas a preceito |
As que, num gesto fecundo, |
Traçam a teu trilho o leito. |
|
Assim é que na alegria |
O esforço corre veloz, |
Que à fadiga a fantasia |
De encanto modula a voz. |
|
Assim, nas práticas botas |
Mais que botas aqui ponho: |
Oferto sem preço as notas |
Dum canto que canta o sonho. |
|
|
428 – Genes |
|
Em nossos genes trazemos |
Memórias da vida antiga |
Com que lidar não sabemos. |
|
Isto é que então nos obriga, |
Tudo parecendo novo, |
Sempre a retomar a briga, |
|
Mas o que quer o renovo |
É que temos de aprender |
A integrar, em quanto aprovo, |
|
Memória arcaica que houver |
Do antigo que já não provo |
Com o que hoje ando a viver. |
|
Apenas com este evento |
Talho desenvolvimento. |
|
|
429 – Atingir |
|
É bom sonhar a utopia |
Para atingir a ladeira |
Que dela aproximaria. |
Se o cume é a meta cimeira |
Que visarei na montanha, |
Quando a morte se me abeira, |
Se a meia trilha me apanha, |
O que importa é que eu já vinha |
No meu caminho, com sanha. |
Não só não perdi a linha |
Como tenho a encosta ganha |
Do topo que se avizinha. |
|
|
430 – Conduzir |
|
Noutros carros acreditam |
Homens conduzir destinos |
A cento e cinquenta à hora, |
Que mais depressa debitam |
Novos pontos e mais finos |
De partida em frente agora. |
|
Esqueceram-se, porém, |
Que nunca chega ninguém: |
|
Nunca se fecha o porvir: |
- Estamos sempre a partir! |
|
|
431 – Teme |
|
Quem teme ser infeliz |
Nunca feliz há-de ser. |
Vamos sentir de raiz, |
Deixar a emoção crescer |
E deixemo-nos levar |
No leito corrente e frio |
Tal como água a murmurar |
Se entrega gratuita ao rio. |
|
E no rio do infinito |
Acalmemos nosso grito. |
|
|
432 – Luz |
|
Vem a luz lá do infinito |
E acaricia um objecto: |
Vejo, acolho-o sob meu tecto |
E do nada me desquito. |
|
Um objecto é o que, afinal, |
Toca em meu imo, real: |
Íntimo torno o infinito. |
|
|
433 – Espaço |
|
Somos feitos de tal modo |
Que nos vemos atraídos |
Do espaço para o engodo |
E nos julgamos capazes |
De nele sermos movidos, |
De a voar devirmos ases. |
|
Imenso e livre, infindável, |
Ante nós se estende, inteiro, |
Tão real, percepcionável, |
Como o nosso cativeiro. |
|
Por que existe este infinito |
Se o não toca nosso grito? |
|
|
434 – Piquenique |
|
Piquenique é mesmo a vida: |
Mergulha a felicidade |
Na companhia querida, |
Na esperança que me invade |
Moderada e optimista, |
Numa dose de alimento |
Razoável e prevista |
Que dê conforto e sustento. |
|
Tudo mais a convicção |
De poder ir sempre além |
Com o esforço do empurrão |
Do sonho que move alguém. |
|
|
435 – Céu |
|
O céu é ficar vazio |
De tudo ante o azul dos céus, |
E cheio ficar do rio, |
Apenas do rio Deus. |
|
Mas, enchendo-me de Deus, |
A mim me encontro eu então, |
Realizo os desejos meus, |
Sou feliz de supetão. |
|
E sou mais perfeitamente |
Eu próprio na ocasião |
Do que fora anteriormente |
Noutra qualquer situação. |
|
|
436 – Degrau |
|
Quando deixo de puxar |
Tudo para o racional, |
Então vou-me conectar |
À emoção mais radical. |
|
No degrau dela abissal, |
Aí me conecto ao céu: |
Um pouco menos mental, |
Mais eu sou não sendo eu. |
|
- Então Tudo, sem eu ver, |
Principia a acontecer. |
|
|
437 – Emoção |
|
A emoção tens de vivê-la |
No potencial mais puro, |
Colhida no ponto zero. |
Só se for vogando à vela |
Até ao porto seguro |
Do imo do coração mero, |
Do centro do sentimento, |
É que a emoção se recentra, |
Correcta se localiza. |
A partir daí aumento |
Uma força que se adentra |
Planeta além como brisa. |
|
Poderosa imensamente, |
Quem nunca entreviu a força |
Da emoção daquela mãe |
Que um filho quer, veemente, |
Salvar de quanto o distorça |
Trilha fora, vida além? |
|
Após centrada, a emoção |
É poderosa alavanca |
Sempre à mão da Humanidade. |
Quando não se centra, então, |
Vagueando a capricho, manca, |
Perde o miolo e se evade. |
|
|
438 – Insistes |
|
Tens vida desconfortável, |
Porventura atrais doenças, |
E bisas, desamorável, |
Em ti próprio pouco pensas. |
|
Nos outros foges de ti, |
Deste foco deslumbrante |
Que é o eu que sempre em ti vi. |
Foges porque a luz brilhante |
|
Íntima é difícil vê-la, |
Outrem não te põe em causa |
E o eu joga-te à procela, |
Os outros dão-te uma pausa |
|
E o eu dói de que maneira! |
Não aceitas teu papel |
De construtor duma leira |
De Universo que te impele, |
|
Metido na gigantesca |
Trabalheira evolutiva |
Onde corre principesca |
A humanidade votiva. |
|
|
439 – Encontro |
|
É um estado de alma a Glória, |
Um encontro, uma união |
Entre terra e céu, memória, |
Fim em si, depuração. |
|
Será neste estado puro |
De percorrer o caminho, |
Que a ligação fina apuro |
Com Deus que em mim adivinho. |
|
Não é preciso no céu |
Estar, como nas alturas, |
É do imo estado sem véu, |
É nosso imo sem rasuras. |
|
Poderá ser alcançada |
O físico corpo estando |
Em qualquer lugar da estrada, |
É o testemunho ligando, |
|
Vivo sentimento fino |
E abnegado que me eleva, |
O Infinito por destino, |
Sempre à Luz além da treva. |
|
Glória, feitiço do bem, |
Honra e bênção, é alegria, |
Quando o zero que convém |
Da matéria se atingia, |
|
O espírito sobe e trepa, |
Trepa e sobe, além-destino, |
Estado a beber da cepa |
Dum vinho humano-divino. |
|
Um humano, quando em glória, |
Já não precisa de céus |
Para escolher a vitória: |
É o mais próximo de Deus. |
|
|
440 – Dor |
|
Quanto mais a dor entrar |
Mais longe ficará o dia |
De ela sair do lugar. |
Para sair, que faria? |
|
Não a deixo entrar sequer! |
Por filhos doutrem não sofres, |
Que não amas a quenquer, |
Não te apegas a tais cofres. |
|
Ora bem, podes amar |
Mesmo a pessoa mais bela |
Sem dela te escravizar, |
Sem apego ter por ela. |
|
Doutro modo, vem a perda, |
Ao cimo traz todo o apego |
E o mal que então dali se herda |
Só cortado tem sossego. |
|
Quando atrais o sofrimento, |
A sofrer tu te manténs. |
Quando a perda vem, o evento |
Te confirma em teus améns. |
|
Agarras a dor a eito |
Com unhas e dentes, pois |
Confere teu preconceito |
Do que a vida traz depois. |
|
Como a ser vítima ajuda, |
Tanto melhor para ti. |
Vives de acordo, não muda |
Nada em redor por aí. |
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Então nunca irás sair, |
Não vais deixar de sofrer, |
Só para poder cumprir |
O que esperará quenquer. |
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Fica então tudo ao contrário. |
- Quando a perda te vier |
Liga-te ao Infindo vário, |
Ao Oceano do Ser. |
|
Assim deixa-O controlar |
Teu processo evolutivo, |
Até ao cume trepar |
É o Todo à mão ter esquivo. |
|
Daí vem-te a inspiração |
Que te elevará do chão. |
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441 – Termómetro |
|
Toda, toda a gente quer |
Que outrem termómetro seja |
Do que gostará de ser. |
Desde que outrem em mim veja |
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E ache que sou já quem sou, |
Significa que serei. |
- Tal cuidando, assim me vou |
A depender, como lei, |
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Do que outrem pensar de mim. |
Para os outros vivo então, |
Giro todo o tempo assim |
De mim qual a opinião. |
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Malha de opinião alheia, |
Só sou se afirmam que sou. |
A crítica que me ameia |
Abomino: magoou. |
Crendo que é verdade, então |
Me revolto, não me agrada. |
A provar que serei são |
Mais fora viro a jornada. |
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Fugindo a meu interior |
Vazio, escuro e sem jeito |
Hipersensível calor |
Me dói mais e mais no peito. |
|
Todas as perdas atraio |
Que a doença pode dar, |
Acidentes, mortes, raio |
Que me possa iluminar, |
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A ver se descubro um dia |
Que não é fora de mim |
Que um eu vero se anuncia, |
Se ao desterro porei fim. |
|
É cá dentro, bem no fundo, |
Neste lugar que ele hiberna |
De magia onde me inundo, |
Portal duma vida eterna. |
|
Ao cruzar este portal |
Me encontro nos campos meus, |
De mim encontro o sinal |
E então me encontro com Deus. |
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442 – Bens |
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Um homem não vem à terra |
Para dos bens materiais |
Desfrutar a que se aferra. |
As almas à terra vêm |
Para entrosar com os mais |
A evolução que convém. |
Enquanto andar distraído |
Com a matéria, porém, |
Ninguém corre evoluído. |
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Cada qual, a evoluir, |
Atende ao seu coração, |
O que diz a distinguir. |
Todos por ele lerão |
Os sinais que hão-de surgir. |
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Os sinais por todo o lado |
Andam por aí perdidos, |
É um tempo a ser decifrado. |
Temos de apurar sentidos, |
Aguardar e procurá-los |
Espalhados pelo chão, |
E depois interpretá-los |
Sempre com o coração. |
|
Com a leveza do fumo, |
Isto é que me aponta o rumo. |
443 – Importa |
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Ninguém é para encaixar, |
Cada qual tem um formato |
Que pode outros enquadrar, |
Só que importa um desacato. |
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Nas vagas de emprego de hoje |
Se ninguém se sentir bem |
E se entender que então foge, |
Busca rumo mais além. |
|
Depois, se logra encontrar |
Dentro dele própria luz, |
A que diz que seu lugar |
Nenhuma vaga o traduz, |
|
Traz novo formato então |
Ao sistema laboral, |
Novas ideias que são |
Das consciências fanal. |
|
Ao pôr em prática a ideia, |
Rasga um trilho de experiência |
Na profissão que encadeia, |
Ocorre nova vivência. |
|
Encontra a felicidade |
Dele no labor, primeiro, |
Que a luz que tudo lhe invade |
Lhe encontra o eu verdadeiro. |
|
Desenvolvendo a missão, |
Projecta mais longe a vida, |
Outros se lhe aliarão |
E a própria luz é seguida. |
|
Aqui não há sofrimento, |
Não há vitimização, |
Nem pânico, depressão, |
- É dum novo mundo o advento. |
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444 – Usufruis |
|
Quando usufruis sem apego |
Estás sempre a ser feliz, |
Bem, sabendo e no sossego, |
E crendo que, da matriz, |
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Outra coisa a vida traz |
Com que a tua evolução |
Amanhã continuarás |
Noutros termos, noutro chão. |
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Mas o mundo isto não vive: |
Apega-se de tal modo |
Ao que logrou e que arquive |
Que descarta todo o engodo |
|
Construtivo que trilhar |
Um rumo o fez até lá, |
Até vir a amontoar |
Tudo o que hoje amontoará. |
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Pelo apego é que envereda |
E de perder pelo medo, |
Caminho que não conceda |
Que cresça mais, tarde ou cedo. |
|
De foco todos mudaram |
E mudaram de caminho. |
As relações transitaram |
Para o que têm no ninho |
|
E que não querem perder, |
Em vez de continuarem |
A ir-se desenvolver, |
A crescerem, germinarem. |
|
Depois do apego, vem perda, |
Deixou de se construir. |
O pedestal que aquilo herda |
É inerte, não deixa ir. |
|
Todo o Universo é, porém, |
Constituído de mudança. |
Logo a decadência advém |
A quem isto não alcança. |
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44 5 – Empréstimo |
|
Usufruir, nunca apegar, |
Empréstimo é quanto têm |
Da vida, quando o quer dar, |
Que ela é que tudo retém |
E pode, a qualquer momento, |
Vir retirá-lo do evento. |
|
Ou para dar outra coisa, |
Ou, se a perda é programada, |
Inserta dela na loisa, |
Pôr-te a zeros, não dar nada. |
Acolhe quanto vier: |
- Findas, por fim, a crescer. |
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446 – Esperança |
|
Da esperança vem a espera, |
Vem da luta desigual |
Que existe entre o bem e o mal |
E do que por ela impera. |
|
Quando espero, sei que nada |
Posso fazer, sei que tenho |
De parar a punhalada, |
Fim da luta a que me atenho. |
|
Aprendo a cooperar |
Com o céu de que me esqueço, |
Reajo esperando, é o preço, |
Na espera aprendo a entregar. |
|
Quem espera, entrega: |
Sabe que não pode, |
Sabe que não sabe, |
Nem sequer delega, |
Já nada lhe acode, |
Tudo nela cabe. |
|
Quem espera sente então |
Que é mero suporte apenas |
Dos eventos e das cenas, |
Um veículo no chão |
|
Duma vida a acontecer |
Por si própria livremente. |
Quem espera há-de saber |
Que sozinha vai em frente |
|
A vida, sem que se tenha |
De lhe colocar a mão. |
Ao esperar, o que venha |
Aceito, sem condição. |
|
Dure o que durar, |
A minha impotência |
Ante qual o rumo |
Acato sem dar |
Ar de impaciência: |
Entregue me assumo. |
|
Entrega é o que nos acalma, |
Fonte da sabedoria, |
Mas jamais será vazia, |
Ajeita-nos, faz ter alma. |
|
Traz a esperança consigo |
E sempre a não-desistência: |
O que vem a meu abrigo |
Não sei mas sei de evidência |
|
Que vem, então não desisto, |
Porque sei que ele há-de vir. |
Não sei o que é, mas insisto, |
Confiando que o porvir |
|
Nos traz o melhor. |
Difícil mergulho |
No desconhecido: |
O efeito é um fulgor |
No imo, sem barulho, |
Luz do inatendido. |
|
A esperança traz a espera, |
A espera a crença traduz |
E da fé que me exaspera |
Rebenta infinita a Luz. |
447 – Perito |
|
O repetidor é aquele |
Que, olhando para o passado, |
Repete-o na própria pele, |
É perito no traslado. |
|
O transformador é quem |
Olha o passado e o transmuda, |
Já o não repete ninguém |
E ninguém mais se lhe gruda. |
|
- Ora, o sentido da vida |
Ao transformador convida. |
|
|
448 – Tentar |
|
O acto mais debilitante |
Que podes agir na vida |
Algo é não tentar, perante |
A crença paralisante |
De que a meta é já perdida. |
|
Pára o fluxo de energia |
Antes de haver começado. |
Não pares em tua via |
Onde tudo principia |
Antes de a ter palmilhado. |
|
Pois, quando tu páras antes, |
De certeza que não chegas |
A lado algum, como dantes. |
Neste caso, o que garantes |
É que acertas no que negas. |
|
|
449 – Atitude |
|
A atitude a transformar |
É a tendência da procura |
Do que nos gratificar |
A curto prazo, com cura |
|
Da cegueira quanto a efeitos |
Do que vem a longo prazo. |
Ficamos então afeitos |
À lonjura a que der azo. |
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450 – Impactos |
|
Os impactos duma escolha, |
Duma decisão tomada |
No momento que a recolha, |
Raramente, na jornada, |
|
Se limitam ao momento |
Em que ela foi decidida. |
Decides mais num evento |
Que o que de lá te convida. |
|
Portanto, repara bem |
Nos horizontes de além. |
|
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451 – Sois |
|
Todos sois seres divinos |
A assumir da eternidade |
Um ou outro dos destinos, |
Conforme o que mais agrade. |
|
Repara nos gestos teus, |
Lê bem no fundo o que são: |
Sendo enformação de Deus, |
Tu és Deus em formação. |
|
|
452 – Transformarias |
|
E se achares que és um anjo |
Por que alguém esperar hoje? |
Transformarias no arranjo |
Quem tocas e que te aloje. |
|
Não tens nada de especial |
A fazer: só tens de ser. |
Ser teu eu angelical: |
Vais sendo, nada a fazer. |
|
Embora então faças Tudo, |
Grão a grão, desde o miúdo. |
|
|
453 – Sonho |
|
Todos temos instrumentos |
Que nos permitem criar |
Sonho em todos os eventos, |
Por mais que ele se elevar. |
|
Escolhemos não fazê-lo |
Porque não acreditamos |
Que funcione tal elo, |
Ou nem sequer nos lembramos |
|
Dos instrumentos que temos, |
Ou então porque empenhados |
No que está tal qual havemos |
De andar em todos os lados. |
|
|
454 – Embarcaste |
|
Consciente, inconsciente, |
Como farás a viagem? |
Tudo porque tão somente |
Não podes desembarcar: |
Embarcaste na romagem |
Desde antes de haver nascido. |
Nascer foi sinalizar |
Que é o comboio, enfim, partido. |
|
|
455 – Defines |
|
És o teu legislador, |
Defines orientadoras |
Linhas que te vais propor. |
|
E dos actos cometidos |
Metas avaliadoras |
Escolhes, como os sentidos. |
|
E os que estás a cometer |
És tu quem os avalia, |
Pois foste tu a escolher |
|
Quem e o que realmente és, |
Quem queres ser dia a dia. |
E julgar alguma vez |
|
Da natura de teu acto |
Só tu és capaz de facto. |
|
|
456 – Condenes |
|
O que julgas mau no mundo |
Não condenes, não condenes. |
Pergunta-te bem no fundo |
De teus juízos perenes |
|
Quais errados foram, quais |
As medidas, se as houver, |
Que desejas tomar, tais |
Que alterem o que te fere. |
|
Teu interior interroga |
Mais do que exterioridades, |
Pergunta-lhe o que ele advoga: |
“De mim que realidades, |
|
Que partes de mim desejo |
Agora experienciar |
Ante a desgraça que vejo, |
A que prefiro apelar?” |
|
Porque toda a vida existe |
Como instrumento da tua |
Própria criação que insiste |
Em tomar corpo na rua. |
E todo o evento que houver |
É mera oportunidade |
Para decidires ser |
E ser quem és de verdade. |
|
|
457 – Medida |
|
Medida a lonjura |
Daqui donde estás |
Ao ponto que augura |
Onde alcançarás, |
|
Começa a mudar |
Conscientemente |
Todo o teu pensar, |
A palavra em mente, |
|
Os actos, de acordo |
Com tua visão |
Do mais alto bordo |
Que há de ti à mão. |
|
É um enorme esforço |
Físico e mental. |
Observa o escorço |
Sempre até final, |
|
Vai do pensamento, |
Da palavra ao acto. |
Com discernimento |
Escolhe e tem tacto. |
|
Movimento em bloco |
Rumo à consciência, |
Descobres no foco |
Que tua vivência |
|
É que meia vida |
Foste inconsciente, |
Ignorando em lida |
O que era presente: |
|
O que decidias |
Em mente, acto e termo |
No efeito não vias |
Que te punha enfermo. |
|
|
458 – Imagina |
|
Imagina tua vida |
Como queres que ela seja. |
Para lá vai de seguida, |
Que a palavra se reveja, |
|
Cada pensamento ou acto. |
De acordo o que não esteja |
Verifica mui pacato, |
Foge disso que te aleija. |
Quando houver um pensamento |
Que não se enquadre na tua |
Visão de ti em aumento, |
Novo pensamento actua. |
|
Se disseres uma coisa |
Que em ti, no melhor conceito, |
Não mergulha nem repoisa, |
Elidi-la toma a peito. |
|
Se em desacordo contigo, |
Com o teu melhor intuito, |
Ages, sê de ti o amigo, |
Não o aceites nem fortuito. |
|
E depois farás as pazes |
Com todos os envolvidos, |
Por igual todos capazes |
De perder rumo e sentidos. |
|
|
459 – Plano |
|
Não podes perder o jogo, |
Nisto não podes errar, |
Não é do plano. Então, logo, |
Não há como não chegar |
|
Ao lugar aonde vamos, |
Não há forma de evitar |
O destino que queiramos. |
Se Deus é o alvo a alcançar |
|
Estamos mesmo com sorte: |
É tão grande luminar |
Que nos meteu no transporte, |
Ninguém tem como falhar, |
Pois como operar tal corte? |
|
|
460 – Complexo |
|
Qualquer alma quer ser Deus, |
Mas ser Deus em que pendor? |
É tão complexo em seus véus, |
Multi-sensual factor, |
|
É multidimensional |
E tão multifacetado, |
É um milhão e um só real, |
É o irreal e o sagrado!… |
|
Então, Deus ao procurar, |
As almas têm à frente |
Uma tarefa sem par, |
Uma listagem ingente |
|
De existências a escolher. |
E é o que neste mesmo instante |
Cada qual anda a fazer, |
Tipos de ser pondo diante |
|
Para após proporcionar |
Condições certas, perfeitas, |
Com as quais vir a criar |
Vivências a tal afeitas. |
|
Então nada te acontece |
Nem nada através de ti |
Que não seja o que aparece |
Para o maior bem em si. |
|
As almas nos orientam |
Para as oportunidades |
Ideais que se apresentam |
Para, através das idades, |
|
Podermos experienciar |
Tudo o que se planear. |
|
|
461 – Curam |
|
Os que curam têm fé, |
A fé que penetra já |
No saber do Todo até. |
Sabem que o Homem está |
|
Destinado a ser completo, |
Uno e perfeito, é um invento |
Não adiado mas discreto, |
É-o no presente momento. |
|
Aquela sabedoria |
É também um pensamento |
Mui poderoso que avia |
Serviço a todo o momento. |
|
Tem o poder de mover |
Serras, para não falar |
Nas moléculas que houver |
Em teu corpo singular. |
|
Lograrão então curar |
Muitas vezes à distância, |
Que ao pensamento a voar |
Nem ela tem relevância. |
|
Corre o mundo o pensamento, |
Cruza o Universo, medita |
Muito mais veloz que o vento, |
Do que a palavra a ser dita. |
|
|
462 – Pardal |
|
Seguir o pardal dos bosques |
Da intuição interior |
Que te chama donde embosques, |
Da vida neste pendor |
Para a vindoira que ignoras |
Mas te murmura a desoras… |
|
Respondemos quando medo |
Não temos e confiamos |
Que a direcção, tarde ou cedo, |
Que a tomar nós estejamos, |
Quando embora derradeira, |
É para nós a certeira. |
|
Ouvir é uma nota pura, |
A melodia afinada |
Que só nosso ouvido apura, |
Canção duma desgarrada |
Que sempre entoar podemos |
Quando atenção lhe prestemos. |
|
E quão fundo confiamos |
Em nossos subtis afectos |
Sem ver para onde estamos |
A ser levados, sem tectos, |
Nem a quem nos dirigimos |
Na fundura nem nos cimos! |
|
|
463 – Convencem |
|
Cientista, é de estatísticas |
Que me convencem as coisas. |
Amadureço e são místicas |
As contas em minhas loisas. |
|
Mais e mais impressionado |
Com a frequência de eventos |
Improváveis que me é dado |
Ver a todos os momentos, |
|
Nesta improbabilidade |
Começo a ver impressões |
Digitais de Deus que invade |
Assim os nossos balcões. |
|
Pouco a pouco a madrugada |
Ilumina lenta a estrada. |