AMANHECER
Base
Numa base militar
Ninguém lá fotografias
Poderá nunca tirar
De autorização sem guias.
Quando o autorizador
Decide fotografar,
Logo o polícia mentor
As virá verificar.
“Mas sou eu quem autoriza!”
“A mim não me importa nada.
Ou tem guias com divisa
Ou a máquina é apresada.”
O autorizador o bloco
Toma em mãos mais a caneta,
A si se autoriza, em foco,
Com a rubrica completa.
O polícia verifica,
Faz correcta a continência,
Vai-se embora, tudo indica
Com a mais limpa consciência.
- E eis como a burocracia
Mata a vida todo o dia.
Corte
A mulher pediu
A um colega meu
Corte de cabelo.
O nosso problema
É não ter sistema
De por cá fazê-lo:
- Numa livraria
Como poderia?!...
Melhor
É melhor ser infeliz,
Mas disto bem inteirado,
Que feliz ser quem se quis
Como um idiota chapado.
Agita
Agita com ele a imprensa,
Com todo o mundo conspira.
Todos cuidam que ele pensa
Mas simplesmente transpira.
Talentos
Talentos pagam-se caros,
Quem tem não os tem gratuitos.
É que os talentos são raros
E os estúpidos são muitos.
Trepado
Homem sem ter formação
Trepado ao trono superno
Não tira as patas do chão,
Será sempre um subalterno.
Pode
A normalidade
É sofística:
Mera estatística,
Pode ser da insanidade.
Se da sanidade for,
O sofisma ainda é maior:
Alguém verdadeiramente são?
Só mesmo por excepção!
Dentro
Dentro de mim
Acoita-se a nota
Sem fim
Dum idiota.
Ora
Ora tudo o tempo todo
Ao bebé sempre me impele,
Ora me impele o engodo
De tirar é férias dele.
Presépio
Ser um presépio devia
Um bebé, quebrando o enguiço,
Mas é sempre, em cada dia,
Muito mais um reboliço.
Tornamos
Quando nos tornamos pais,
Largo as idealizações
Dos filhos por filhos reais,
Dos pais pelos pais morcões.
Sono
Quando uma pessoa morre
Durante o sono, o requinte
É ver ela o que lhe ocorre
Então na manhã seguinte.
Consciencioso
Diz consciencioso o ladrão
À vítima ali sem porto:
“Foi você ou seu irmão
Aquele que já foi morto?”
Evitar
Diz o advogado
Deveras apostado
Em evitar o presídio
Ao
réu:
“Quantas vezes cometeu
Suicídio?”
Gostei
O ex-aluno à professora:
“Eu sempre gostei de si.
Favoritos?! Essa agora!
Foi desde a primeira hora,
Má com todos quantos vi!”
Menina
A menina de cinco anos
Queria muito ser pomba,
De voar não por ter planos
Mas para lançar a bomba
De encher de cocó mil tarros
E os despejar sobre os carros!
Só
A televisão
Convence-o?
- Ligo-a só para não
Ouvir o silêncio...
Criado
Um bebé criado ao colo
Tem direitos adquiridos,
Sente-se atirado ao solo
Se ao colo o tiram bandidos,
Grita mais que uma central
De carácter sindical.
Primeira
A vida nos ensinou
Já desde a primeira hora,
Bebés deitados na cama,
E em campo algum contestou:
- Será sempre o que não chora
Aquele que nunca mama.
Antigamente
Antigamente diziam
Que a criança sem saúde
Era das asneiras que à mãe cabiam.
Hoje, não, ninguém se ilude.
Nem é preciso.
As mães encarregam-se de se culpar,
Em todo e qualquer lugar,
Com muito siso.
E quanta falta de juìzo!
Arriscas
Leva um filho de três anos,
Se arriscas a te perderes.
Se te queixas dos enganos
Por o caminho não veres,
Ouve o bom senso contido
Do miúdo para ti:
“Não estás nada perdido!
Não vês que estás mesmo aqui?!”
Feia
“A palavra feia, então,
Não deves nunca dizer.”
“Está bem... “ “Porque a disseste?”
“A cabeça que me deste
Disse para o não fazer
Mas faz a boca o que quer...”
Chocolate
O amor é tudo, afinal,
De que iremos precisando.
Mas também não fará mal
Um chocolate de vez em quando.
Difícil
Na guerra
Quanto auto-sacrifício
E coragem moral!
Ao invés, na minha terra,
Que difícil discernir um resquício
De quem é nosso amigo, afinal!
Belo
Quem é bonito, é bonito.
Belo, porém, é suposto
Ter um novo requisito:
Ser amável, com a luz
Que o coração traduz.
Senão é apenas: “Parabéns pelo seu rosto!”
Aposto
Aposto até que é um problema
Gostares de toda a gente,
Ó Deus. E muito me intrigo:
Quatro em meu lar, por sistema,
Somos e, por mais que tente,
Eu deveras não consigo...
Arriscas
Aposta
Na vida,
Onde quer que seja sentida.
Quanto mais arriscas a vida,
Mais o chefe gosta?
- Nunca são eles, afinal,
Que pagam o funeral...
Morte
A morte é esquisita.
Não se fala nela por receio
De ela poder ouvir
E, da conversa pelo meio,
Decidir
Fazer uma visita.
Domina
A mulher domina a cama,
Porém, omite-o.
Mas, quando o leite se derrama,
É sempre o homem que tem de dormir noutro sítio.
Mão
A mão dum cavalheiro,
Por mais que gentilmente gratuito,
Da bolsa do dinheiro
Nunca se afasta muito.
Riqueza
A riqueza entediada
Nem creias
Até onde poderá ir
Pela oportunidade adorada
Que lhe permitir
Intrometer-se em questões alheias!
Cavalo
O cavalo mais fino
Não deixa de ser um cavalo.
Com mais ou menos tino,
Alguém finda a montá-lo.
Terás de decidir o que queres.
Retorno ao lar?
Há um preço a pagar.
Controlar a vida que tiveres?
Há um preço a pagar.
Livre para dizer que não?
Até aí há um preço então.
Pouco importa o que mereço,
Há sempre um preço.
Quererei ser um cavalo?
Meço
O regalo
Mas não me esqueço...
Conto
Contar um conto melhor?
São mais simples as mentiras,
Com mais sentido e sabor,
E não cuidas que deliras.
Sonha
O maneta,
Quando sonha, tem duas mãos.
É o profeta
De todos nós, os manetas irmãos.
Pobres
Estes pobres homens ricos
Que, não te podendo conquistar,
Tentam comprar
O que não pode ser comprado
A penicos
De oiro despejado!
Não há maneira de entenderem nada
Do rumo da humana jornada.
Carta
Uma carta o sacerdote
Recebeu e é só: ”Palerma!”
Comenta, acolhendo o bote:
“Assinou. No mais é erma...”
Plana
Ele quis, a caminhar,
Com a estupidez à solta,
Que a Terra é plana provar...
...Mas então eu dei-lhe a volta!
Pára
A cabeça é impressionante,
Trabalha a todo o momento,
Do ventre materno em diante...
- Só pára no Parlamento!
Sapateiro
Se ao médico tu não vais
Para reparar sapatos,
Ao sapateiro a teus ais
Pedes a cura em teus actos?!
ÍNDICE
Madrugada
Dilúculo
Alvorada
Antemanhã
Alvor
Aurora
Alva
Manhã
Amanhecer