MÉTRICA REGULAR
A UTOPIA
Famoso
O famoso que é famoso
Porque a vida deu à fama
Tem um ego fragoroso,
Perdeu de si toda a trama.
Ao invés, se em luz se tece,
Então magia acontece.
E finda a atingir mais fama
Do que aquele que a reclama.
É que ele é mesmo fecundo:
- De luz ilumina o mundo!
Suicida
O suicida não pergunta:
Que haverá dentro de mim
Que deve coisa defunta
Ser de vez, para que, assim,
Possa, depois de morrer,
Eu deveras renascer?
A tentação só revela
A urgência de transformar,
Mudar um pendor ou tela
Da pessoa a quem minar.
De destruir a vontade,
Não, porém, que sobrenade.
Escapar do suicídio
Provém da capacidade
De, lá fora do presídio,
Vislumbrar a novidade
De alma a chispar, bem no fundo,
Fermentando um novo mundo.
Encara
Meu imo meu inimigo
Encara como mentor
De treinar a aceitação,
A paciência, o perdão...
- Apenas assim consigo
Evoluir me propor
Rumo à realização
De meu fito interior,
Até a senda espiritual
Vir a cobrir no total,
Até a ponta do Infinito
Agarrar que daqui fito.
Fiel
Quem é fiel a seu imo
Não tem mais parcialidade,
Em cada qual vê-lhe o cimo
Da íntima realidade
E actua de mil e um modos
A beneficiar a todos.
São por igual importantes
Tanto o que o abençoou
Como o que o prejudicou:
Todos preciosos instantes,
Todos fermentos de vida
Ao Infindo a ser erguida.
Porta
Eu sou ponto de chegada
Do nós cósmico comum.
O ego é que a porta de entrada
Fecha aos mais, a cada um.
Quando a voz do ego é calada,
Descubro que tudo é Um.
Então em mim o Infinito
Germina aquilo que fito.
Muito
Seremos nós imperfeitos
Porque há muito a caminhar?
A doença, pelos jeitos,
Será um modo de ajustar,
Fio a fio ao reparar,
A teia humana no grito
Que clama pelo Infinito.
Trabalho
Como viver para nada,
Sem nada querer fazer?
Sem ao trabalho afeiçoada,
Nenhum sentido há-de ter
A vida em cada jornada,
Toda nela a emurchecer.
Só quando cubro algum fito
Espreita em mim o Infinito.