VISLUMBRES DO INFINITO































Roteiro



Quem eu creio ser, no fundo mais profundo,

Que faria aqui?

- O roteiro do novo mundo

Principia aí.



Mas depois, quem creio ser, quem creio,

Em que deveio?



E um novo roteiro

Sucede ao primeiro.



E assim sucessivamente

Sempre em frente, sempre em frente...



Não há fecho no caminho:

- É o Infinito que adivinho.





Exerço-me



Ao agir eu me incorporo,

Alma na matéria,

Exerço-me, poro a poro,

Pessoa sidérea.



A mim próprio me mostro,

Actuo minha energia,

Afilado rostro

Que o mundo entalha e fasquia.



Se agir em discordância

De meu imo,

Ao Universo entrego a discrepância

Distorcida de meu cimo.



Devolve-me ele meu eu distorcido

Que nem quero ver,

O meu fingido

Ser.



Aí me distancio

Do caminho

Que vim à terra fazer,

Serei um desvio.

Ao invés, se comigo me alinho,

Cada vez mais serei eu,

Na Terra uma pontinha mais e mais de Céu.





Cumprir



Agir a cumprir um sonho

Semeia a energia

Que ali ponho:

Desata a crescer em mim

De dia para dia

E não mais tem fim.



É assim que repleto

De Infinito me completo.





Topo



A ambição

De ser alguém evoluído,

Se nela crês do coração,

Não tarda muito a tua estrada

Há erguido

Ao topo da encumeada.



E o Infinito vai adorar

Poder ajudar.





Harmonia



Sempre que conseguires operar

Em harmonia com teu imo,

Mais trepas

Ao cimo,

Para além dos véus,

Mais logras penetrar

Nas cepas

Dos Céus.



Senta-te, aquieta-te e medita,

Ouve a tua fundura,

Acolhe aquilo a que te concita

Com finura.



E sente, sente,

Com desenvoltura,

Do Infinito

Honestamente

O inefável grito.





Fundura



Teu imo, na fundura inatingível,

É teu mestre.

Ele é que te ensina

O trilho vivível,

Ele é quem te adestre,

A partir do que a sina

Te destina,

A moldar o que se apreste.



Ele é que sabe do rumo

De espremer do Eterno o sumo.



O que te irá fazer feliz

Sabe-o ele de raiz,



Sabe onde encaixo

Com os recursos cá de baixo.



Tem o meu plano de vida

E tenta que eu o cumpra de maneira

Que cada dia um degrau mais na subida

Trepe, do Infinito abismo à beira.



Hoje é o dia

De correr atrás

Da ousadia

Do que deus me faz.





Dente



Todo o mundo roda

E na roda há um encaixe.

Eu sou dente na roda

Onde inteiro me enfaixe,

À espera de mim

A romper caminho pelo Infinito sem fim.





Desilusão



Com medo de acreditar,

Devenho céptico ou ateu

E nem em mim crerei, a par,

Inescrutável por trás do véu.



É a desilusão da fé,

Por mor da chacina das Cruzadas,

Da Inquisição,

Das guerras de religião,

Dos Estados confessionais a forçar pôr-me de pé

Das religiões nas distorcidas pegadas...



Por mor do abismo

Sectário,

Do dogmatismo,

Fatalmente a nos enterrar num exclusivismo

Mortuário.



Medo de acreditar também pelo invés,

Pela rotina,

Onde tudo o que fascina

Sofre um letal revés

E declina.



O problema, porém, não é da fé,

Mas do modo como acredito:

Basta não me pôr ali de pé,

Armado em porta-voz do Infinito.



Se optar pela humildade

De quem jamais pode entender o mistério,

Logo farei que a charrua da fé me grade

Dos Céus com o império.



Crerei no Infinito a semear pequenino em mim

Até ao fim.





Desiludir



O medo de me desiludir

É de querer o Infinito

Logo à frente a me surgir,

Comigo a bulir

Quesito a quesito.



Então procuro cá em baixo,

Na matéria,

Um cacho

Da vinha sidérea.



Logo aí

A vida tal qual é

Deixou de ser em si,

Perdeu o pé.



Quero que o dinheiro, o emprego,

A família,

O relacionamento a que em entrego,

O estatuto social,

Sejam mera vigília

Sacral,

Sem mais consistência

Que doutro mundo esta existência.



Então tudo me desilude,

Que o Céu, só no Céu

E quem com tudo aquilo se ilude

Tudo perdeu:



Perde a terra que abandona, de tão parca,

Perde o Céu que não abarca.



E aqui me vitimizo,

Que os outros não terão

Direito a dar-me tal desilusão,

Envenenado pasto

De vitimização.



Até ao dia

Em que aceite que o sagrado mora acima

De qualquer fasquia

Que me arrima

Na pegada

De minha estrada.



Não atinjo nunca o horizonte,

Apenas a intérmina ponte



De aproximação

Em tudo o que pejar este meu chão.



Apenas aqui acolho a responsabilidade

De trazer à Terra

A espiritualidade

Que o Cosmos encerra.



Tal é a realidade

Que doravante me persuade.



Pés no chão,

O ouvido atento

Ao som

Que ligeiro vem

Do Além

No vento.





Perdi



Como me liguei

À realidade:

Dela escapei

Em nome dum sagrado que busquei

E que perdi, de verdade.



O sagrado (eis a receita)

Apenas através do real espreita.



O Infinito

Aqui

É sempre da finitude o grito

Que sofri.

Mais nada.



O resto é da vida rumo a ele a estrada.





Abriste



Quando decidiste reconverter

Um personagem qualquer

Que confundiste contigo

E que era apenas o medo do perigo

De mais e mais vir a sofrer,

Abriste um postigo

Para o porvir

Com a vida doravante a sorrir.



E libertaste de vez o personagem,

Quenquer que ele seja,

Para a definitiva viagem

(Que, no fundo, almeja)

Que aqui com o Além traduz

O roteiro da Luz.





Arriscas-te



Quando não precisas de controlar,

De julgar tudo em redor,

Nem de te vitimizar,

Vem o ego, com temor,

E diz:

- Arriscas-te a não ser feliz.



Para o ego, o desconhecido,

Tem sempre de ser banido.



Tens uma visão?

- Não é nada disso, não!



Anda sempre a restringir-te a caminhada:

- Não tens capacidade de ver nada.



Quando insistes, a gritaria é pior:

- Do que os outros julgas-te melhor?



Temos de calar sempre esta voz:

Vem da cabeça, nunca somos nós.



Não sou o que penso,

Sou, na raiz, o que sinto:

E aqui, imenso,

Com meu silente grito,

Salto de meu pequeno plinto

Para o Infinito.





Abrir-me



O ego quer-me controlar.

Tenho de desactivá-lo

Para meu íntimo esvaziar

E então abrir-me ao abalo

Pioneiro

Do Universo inteiro:



Irá irromper agora

Por mim

Fora

Como água de Infinito em meu jardim.





Germinarão



Comunicação

Com o Céu,

Só através da intuição

Do íntimo meu.



Com palavras

Ou sem elas,

Logo da vida nas lavras

Germinarão, com o tempo, as sequelas.



Não respeita horário

Este fito:

O itinerário

É Infinito.





Ligar-se



Ligar-se ao Céu

Não é só fechar os olhos,

Entregar tudo o que é seu

E já está:

No jardim

As cenouras, as frutas e os repolhos

Crescem desde lá

Por dentro de mim.



É que a escadaria

Trepa ao Infinito:

Em cada patamar que me extasia

Principia

Novo lanço já predito.



Não há descanso

No remanso

Que concito.



E é sempre assim

Indefinidamente,

Sem fim:

Não há banco onde me assente.



Ou da aventura

Que meu íntimo procura

Fico ausente.





Entrega-te



Entrega-te de tal forma

À íntima energia do Universo

Que nem penses, por norma.

Aí o Infinito te revela,

No reverso,

Dele uma parcela:

Aquela

Que melhor te irmana

Dele à cumeeira mais soberana.





Importante



Importante é a mensagem cruzar

Do Céu à Terra.

Quanto mais gente lá trepar

E a decifrar,

Mais rápida aqui aterra.

E de quanto é imundo, ao propagá-la,

À Terra irá limpá-la.





Lei



O Universo não muda

A teu bel-prazer.

Ou a lei dele se te desnuda

E com ela vais viver

Ou tal não é tua prática

E a vivência é traumática.



Na harmonia

Ficarás protegido,

Não há choque de energia

A pôr-te combalido.



A fonte original

Corre por ti com todo o caudal.



Aqui não haverá perdas,

Nem as tuas nem as que herdas.



No conflito

Sofres choques emocionais.

Será bom se, contrito,

Aprenderes a ler os sinais



E os percorreres, a seguir,

Então dentro e fora a evoluir.



Podias era evitar o sofrimento:

Bastaria ouvir do Cosmos o subtil vento.





Apenas



Para um porvir

À minha medida

Apenas terei de cumprir

Minha parte reconvertida

De vida.



Todos andam a tentar

Outrem mudar,



Acaso ao rumo do Universo

Vê-lo converso,



Mas não têm arte

De cumprir a própria parte:



Ninguém muda

A linha de si testuda.



Ora, sem isto,

Tudo o mais é um mero quisto.



A muda vem de dentro

E culmina num acto:

É quando me adentro

Que atinjo o maior impacto.



Porém, o mais profundo,

É que isto realinha os átomos do mundo,



Fica nele imprimido um rastro:

- Ao mudar-me, eu mudo um astro!



Então,

A intenção



Que protagonizo não é leviandade:

É uma memória para a eternidade.





Mudares



Se tu mudares para melhor,

Mudas, por empatia,

O teu redor,

O que, por sua vez, mudaria

O redor que se lhe seguiria

E assim sucessivamente,

Sem qualquer limite evidente...



- Neste ondular disperso

Vais um dia atingir todo o Universo.





Incondicional



O amor incondicional,

Cá em baixo, na matéria,

Não tem aval,

Só na Infinidade sidérea.



Aqui tudo é dual:

É um amor condicional.



Não cumprida a condição,

Logo vem a rejeição.



E apelamos ao ego

Para montar a defesa

Que nos restitua o sossego:

Findamos do ego presa.



Apesar da calma,

A verdade é que temos menos alma.



A singularidade,

Porém, é que a memória

Busca sempre a perdida glória

Daqueloutra identidade.



E que saudade!



Nunca nos fatigamos de procurar

Aquele modo de amar.



Então ajudamos alguém:

Que bem-estar

Ser útil e relevante contém,

Devir para outrem sem par!



Até paramos nossa busca de Luz,

Nossa fonte, nosso pendor original,

Convictos de que nossa missão naquilo se traduz,

Afinal.



Quando meramente nos andam a propor

Buscar o amor.



Ora,

Isto ainda é o patamar

Do amor de fora,

Falta-nos encontrar

O que cá dentro mora.

O que da fundura nos propomos

É a liberdade

De ser quem somos:

Aí serei do Amor a realidade.



Aí não serei quem

Vem pedir amor ao mundo,

Mas alguém

Que vem doá-lo, fecundo,

Da fundura do fundo,

Ao futuro que aí vem.



Aí serei alma

E não mais ego,

É a minha festiva palma

Que ao Universo entrego.



Aí (quão esquisito!)

É que de mim transborda o Infinito.



Então é cada vez mais Luz

Aquilo que tudo traduz.





Confiar



Ao confiar na fundura íntima de mim,

Em Quem por ela me fala,

Aproximo indefinidamente a grande gala

Do fim.



Abro o canal

Onde concito

Para o mundo real

O Infinito.



E cresço e o mundo cresce

E em cada pedra da montanha

A vida floresce

Tamanha!





Emprestado



Entrega,

Tudo o que é teu teu não é

Da vida na refrega,

Foi-te emprestado à falsa fé.



Quando deixas de querer

Que o mundo gire à tua maneira,

Quando acolhes a vida inteira

Como ela tiver de ser,

Aí desponta iluminado

Todo o sentido da vida de teu lado.



Quando entregas tudo,

Recebes a protecção

Do Céu, por miúdo,

A recobrir todo o teu chão.



Então tudo é bem melhor

Do que algum dia te quiseste propor.



O ego apenas

Quer fugir da dor

Das penas:



Aplica-te à defesa,

Nunca às demandas onde prefiguras

A beleza

Das alturas.



Quando encaro a dor

E caminho pelo carreiro donde dela me liberto,

Desenvolvo-me do teor

Desafiador

Por onde de vez acerto.



A melhor maneira de evoluir

É entender que nada é meu,

Entregar tudo ao Céu,

A seguir,

Abandonar-me ao que vier

E deixar-me, embora sem o discernir,

Definitivamente ser:



Para que tudo seja

O que de ser tiver

Da maneira como a vida o almeja.



Quando for humilde o bastante

Para saber que nada é nosso,

Aprendo de tal modo adiante

Que do Infindo desato a transpor o fosso.





Trilho



Se em cada escolha conseguir

Subir

Pelo trilho mais alto,

O que como o melhor intuir

Como o melhor salto

Para de mim até mim ir,

Até às alturas onde me falto,

Em pouco tempo sei

Que lá estarei.



Como também sei que o rumo é tão esquisito

Que se abre permanentemente ao Infinito:



Há sempre um “ainda não”

Desafiante

A desbravar pelo meu chão

Adiante.





Difícil



O compromisso

É difícil e dói

E quantas vezes destrói

Do anterior lume o chamiço!



Ao mesmo tempo, porém,

Quanta bênção detém

Regando a vida que se aprestou para isso!



E, depois da bênção, um novo desafio

E assim sempre, em intérmino rio...



Até que o horizonte

Culmine do Infinito na primeva fonte.

Aí, da lareira a brasa

É a da minha casa.





Véu



O véu do esquecimento

Retira-me da vida o propósito,

Tornando-a um mero depósito

De vento.

E ao sabor da ventania

Descarto então cada dia.



O dever cumprido,

A resposta relevante

Esmorecem do que é vivido

A cada instante.



Vivemos para operar

Grandes transmutações,

De modo a vivenciar

Mundos novos pelas novas gerações.



O modo mais eficaz

De outrem ajudar

É a mim próprio me transformar,

Capaz,



De modo a inspirar

A que acredite

Que se pode transmudar

Em conformidade com seu íntimo palpite.



O véu do esquecimento

Abre um bocadinho

A lembrar-nos, em seguida,

No cadinho

Daquele momento,

Qual o propósito ali desta vida.



Tudo bate certo

E o sentido sentimo-lo mais perto.



Da vida o hiato

É sentir ou não

Do sentido dela o impacto

Aqui neste verrinoso chão.



É uma tortura

E uma eternidade

Dura

A procura

De nossa identidade

Que no propósito da vida vasculhamos

Quando ainda o não encontrámos.



Terei de me recolher

No melhor de mim

Para aceder

Do Além ao patim

Onde ele mergulha,

Em busca da fagulha.



Lá em cima tudo está pronto para ajudar.

É só parar.

E escutar.





Incarna



O Grande Espírito do Universo

Incarna em todas as formas,

Ora aqui mais terso,

Num Jesus que quebra as normas

A tal ponto que, no termo da fita,

Até ressuscita,

Ora além mais alheado,

Em quantas situações,

Das contradições

Fustigado,

Apenas encerra portões,

Pervertendo, na cadeia das lesões,

O que, afinal, visa o cósmico fado.



E respeita, intransigente, a autonomia

De cada entidade que cria,



Seja uma galáxia, uma estrela, um planeta,

Seja um homem, uma fera, uma chupeta...



O espírito livre e a matéria escrava

Terão de ser eternamente harmonizados

Pela energia com que cada qual no Cosmos se grava

De si próprio nos traslados.



Teremos o equilíbrio de atingir,

Superando os opostos,

Neutralizando a oposição até fulgir

A luz do Infinito em todos os rostos.



Uma vez trepado à Luz,

Nenhum ente retorna à terra dos limites

Com o limite que até então o traduz,

De vez soltos de fronteiras os rebites.



É o raio de Luz

Que dentro de mim concito

E me induz

O Infinito.



Os demais,

Ainda a caminho,

São por dentro de mim os sinais

Dos tremedais

Onde atolo a pegada em terreno maninho.



Com todos compartilho

O meu trilho.



Tenho de me libertar

De tudo o que em mim é prisão

A coarctar

Qualquer voo meu pela amplidão,



De modo a livrar da cadeia,

Entregando-os à romaria do Infinito

Que nos encandeia,

Todos os entes que em mim concito

Distantes deste fito.



Para ao fim todos sermos a grande festa

Para a qual a intimidade do imo em todos se apresta.



Nos de aquém e nos de Além

Tudo prenuncia

Um grande Bem:

A final festa da alegria.



À luz da fogueira, a quentura da brasa

É, definitiva, a nossa casa.





Bomba



Toda a matéria é energia condensada.

Meu corpo é uma bomba de energia

Aqui parada.



Sou eu o guia,

A determinar

Como a usar:

Se para bem da humanidade,

A paz nos invade;

Se para mal,

É de mortes o estendal.



Como utilizá-la

Para aumentar dos homens, do mundo, do Universo

A cósmica gala

Desde o berço?



Primeiro, o amor:

Senti-lo e vivê-lo.

Depois, da gratidão o penhor:

Em cada pegada, do Infinito o selo.



Como a vida opera em eco,

Quando mais por aqui vou

Mais, no retorno do voo,

É aquilo que recolho no meu beco.



O conflituoso

Briga perenemente com alguém.

Requer o conflito para, estremoso,

Alimentar o mal que tem.



Quem vive de amor não logra radicar

Num fixo lugar



Nem lhe é ninguém demasiado distante

De quem lhe for semelhante.



Rejeita a violência,

Qualquer que seja a forma dela na existência.



Primeiro dentro de si,

Para a harmonia ser de norma aí.



Depois afastando-se ligeiro

De quem propõe violência como da vida o carreiro.



Quão mais coerente com amor e gratidão,

Mais alto trepa pela amplidão,



Mais tudo o que é meu

Se resume

Em subir ao cume

Fronteiro ao Céu.





Também



Deus é o Todo,

Do inferno ao céu.

Deste modo

Adivinho

Que, mesmo que só um bocadinho,

Também sou eu.





Plenitude



O melhor de mim

É a minha plenitude

Suspeitada,

Entremostrada,

A atrair-me cada atitude

Para realizar-me até ao fim.



Fim que me negaceia do Infinito,

Inesgotável,

Inatingível,

Mas indefinidamente aproximável

Quando o concito,

Indistinguível,

E desta minha lonjura na lonjura o fito.



A cada passo dado

Mais comigo me concilio,

Mais a paisagem se me tem revelado,

O horizonte interminável do desafio.



Desafio que sou eu definitivamente vindo

Projectado do Infindo.



E é o arrebatador

Da Infinidade do amor.





Atracção



Atracção fatal,

Memória dum passado

Herdado

E, aqui como lá, por igual

Desequilibrado.



O grande desgosto de amor:

Um é atraído

O outro, não.

E o desgosto vive na dor

Do traído

A pedir retaliação,

Ou a morte

Pela má sorte

Da excomunhão.



As heranças em nós incorporadas

Não são iguais

Nem garantem reciprocidade.

O código genético são comuns estradas,

A cultura são nelas os sinais

De riscos e rumas para cada localidade

Da própria identidade.



Tudo, porém, comporta

Inúmeras variações

E em cada se importa

De antanho mil pendores de uniões

E desuniões

Sofridas,

Na textura do real inseridas.



Tanto no corpo como na mente

Vivemos e somos toda a gente,



Do passado,

Do presente,

Até do futuro entressonhado,

Glorioso ou temente.



E, quando um herda o pendor

Dum amor,



O par

Pode herdar

Um pendor diferente

Até aquele lhe repugnar.

O jogo das emoções

Tem infinitas variações.



A conjunção é um milagre,

Daí que tanto mundo além se consagre.



Problema é o apego

Com medo da perda.

O desassossego

Ninguém o herda,

É fruto da escolha de nosso alvedrio.



Ou vou no rumo de antanho

Que o produziu

E não terei nenhum ganho

De meu mau feitio,

Ou altero o rumo

Para de vez evitá-lo

E aí poderei trepar a prumo:

Para as cumeeiras do que atingirei

Aí serei

Então de vez abalo.



Viver apegado

É viver pela metade:

Ter-me-ei de mim cortado,

Perdi minha identidade.



Ou rompo com a malvadez, a perversão,

A lonjura de mim que herdei,

Ou então

Nunca meu íntimo eu eu serei.



O desapego por escolha

É tranquilo,

Não uma fatalidade que me tolha,

Das colheitas da vida me esvazie o silo.



Cada um dos dois escolhe plenificar-se

Com a própria utopia,

Caminhando lado a lado a entreajudar-se,

A partilhar-se,

Para cada qual mais longe ir na própria via.



Aí,

Nesta união,

Não há fusão

Nem alibi

Para qualquer mútua confusão.



Não há dependência

Por parte de ninguém,

Nem sequer interdependência,

Ninguém é refém.



Cada um caminha para a própria plenitude

Do outro com a ajuda

E retribui por igual, com a virtude

Do que em verdadeiro nós a nós nos muda.



Cada um cresce, aprofunda e se alarga

Tanto dele próprio na subida

Que a via devém tão larga, tão larga

Nesta interminável ida

Que, de repente, já não há mais espaço,

- É o Infinito que abraço!



E quanto mais em comum

Mais rápido com o Infindo somos um.





Tudo



Não teremos de fazer

Nada ocorrer.



Teremos de permitir

Que tudo ocorra, que, de mansinho,

A seguir,

Tudo ocorre sozinho.



E o Todo, sem iludir,

Vem a caminho.





Sofrer



Sofrer é terapia

Se eu acolher a dor

Para trocar-lhe a fasquia

De quanto dela for

Reprodutor,

Mormente por dentro de mim,

Que dela serei, no fundo, princípio e fim.



Não tem lógica a tristeza,

É emoção.

Não há como ver quanto pesa,

Quanto lhe mede a extensão,



Se é muita ou pouca,

Adequada ou despropositada,

Louca,

A tresvariar da vida na jornada...



Liga directa ao coração.

É sofrê-la de frente

Até perder a compulsão

Presente.



Nunca por vitimização,

A culpar outrem, o mundo ou a vida.

Apenas porque dói, por pena:

A vida sabe a medida

A que me condena

E desafia,

A ver se empreendo a nova via.



Os que querem mudar o que lhes fizeram

Em vez de a si se mudar,

Já perderam

E mais irão sofrer, a par,

Num pesadelo

De novelo

Vida fora sem parar.



Quem sofre por pena não julga,

Entrega-se e, na rendição,

Divulga

Que não é nada neste chão

E lamenta não ter mudado tanto

Que de vez já tivesse estancado todo o pranto.



Aqui

Toca no âmago de si,

Abre-lhe a porta.

Tudo nele então acorda

E o exorta

A transpor da imensidão a borda.



A vida desata a espargir

E dela o rio turbulento

Empurra-nos a jangada com o vento

Para onde tivermos de ir.





Norte



Andam as gentes perdidas,

Sem rumo,

O norte buscando às vidas,

O sumo.



Não funciona o que aprenderam,

Já entenderam.



Para onde, porém, ir

A seguir?



É de visar objectivos

Ou antes é de parar,

Ou então

De nos cinicamente governar,

Ou de seguir o coração,

Ou eventualmente não,

Que nos ignora os motivos

De aqui nos mantermos vivos?...



É uma imensa confusão

E de quão mais informação



Dispomos

Menos sabemos quem somos.



Confundimos

O que sabemos e o que somos

Como se nos devolvera os imos

Sabermos nós muitos tomos.



Desiludem-se da religião,

Dos dogmas em que se enquista,

E as espiritualidades vão

Borda fora daquelas com a lista.



E o virar para a ciência,

A razão,

Como se a inteligência

Tudo resolvera então?



É só reparar em frente:

Porque anda o mundo tão triste,

Tão deprimido e doente,

Se nada àquilo resiste?



É que a espiritualidade

Não é uma religião

Erguida na humanidade.

É ajudar de mão em mão



Cada qual a ser quem é.

Sem ser o que esperam dele,

Embora em nome da fé,

Que é trair a própria pele.



Religiões são pretensas

Verdades encaixotadas:

A todos iguais sentenças,

Das paixões da vida nas chamadas.



De a isto se reduzirem,

Em lugar de ao espírito servirem



Que sopra em cada qual

De modo indefinidamente desigual,



Nunca em tal rumo servirão

A nos desmultiplicar a direcção.



Uma única via

Como seguir

Quando eu sentir

Que noutra corre minha romaria?



A mediação

Só é precisa

Enquanto visa

Libertar meu pé do chão.



A partir daqui o itinerário interior

É sentir-me no que único e livre for.



É a maior conquista a pôr de pé:

Ser quem se é.



Temos dentro de nós tudo.

O mais é aquilo com que me iludo.



E com que, para ser feliz,

Me desiludo

De raiz.



A verdade última a que tudo se reduz:

Somos mesmo feitos de Luz.



É só mergulhar em meu imo

Até ao cimo:



Ir encontrando o meu ideal de mim,

Aí entrevejo o Infinito de meu princípio e fim.





Outrora



Culpa, julgamento e medo

Foram outrora o teu credo:



Tínhamos de obedecer,

Tudo em todos a igual ser.



Religiões,

Governos totalitários,

O poder em mão de brigões

Salafrários,

Todos a ser iguais obrigados,

Massificados.



Ora,

Todos um embora,



Somos todos, em nossas vertentes,

Diferentes.



Vimos do mesmo lugar:

Somos a fusão

Da poeira estelar

Em cada personificada união.



E somos o livre alvedrio

De cada escolha:

A vida avança pelo lábil fio

Do que aí colha.



Doravante não é para obedecer,

É para escolher.



Importa descobrir quem somos,

O que de único traremos à Terra:

O que nela não pomos

Ninguém mais nela o descerra.



Único sou,

Embora parte do Todo,

Chispa que se incendiou

E que iluminou todo o bodo.



Ninguém é igual a ninguém

E na aceite complementaridade

É que o Infinito há-de

Ir despontando trilho além.



É o único que sou

Que terei de procurar,

Que terei de encontrar

Para evoluir donde estou.



Para fazer a diferença

Da vida nos trilhos pedonais,

Buscando a alegria imensa

Para mim e para os mais.



Vou ter de escolher

O melhor de mim,

A utopia sem fim

A que logre aceder,

Lugar único a que vou

Porque aí único sou.



Activo a luz divina

Com minhas mãos terrenas.

É a minha sina:

Iluminar de Infinito todas as cenas.





Liberdade



A liberdade

Na primeira

E derradeira

Matriz,

É ser quem eu sou de raiz,

Ser eu de verdade.



Ser-se quem se é,

Eis o mais radical projecto

A ser posto de pé

Debaixo de cada tecto.



Quantos deixam de fazer aquilo em que acreditam

Por outrem o não querer,

Para não magoar os que os fitam,

Para não falhar, desiludir nem perder!



Não quero outrem magoar,

Ser-lhe motivo de perda,

Não quero desiludir

Nem ferir.

Mas em que é que isto em mim vai dar,

Em que pegada lerda

Irá findar?

É aceitável ser agente

Da minha perda consequente?



Os dois vectores terei de conciliar,

Difíceis embora, a par.



Os meus pendores

Que não magoam ninguém

São, desde logo, os meus corredores

De ir além.



Quando há, porém,

Dependência emocional

Doutrem por mim

Qual

O trilho sem lesão

De me ir aproximando de meu fim

Então?

Não é por mal

Nem com má intenção...



O filho que pretende viver sozinho

E permanece anos demais

Sem bater asas do ninho

Dos pais,

Porque tudo são lágrimas e ais...



O casamento já findou

E o mal casado permanece,

Que a família o aprisionou,

De tanto que com aquilo padece...



É de buscar o precário

Equilíbrio

Sem qualquer primário

Ludíbrio.



Não posso prejudicar

Ninguém

Nem deixar-me lesar

Pelo que doutrem vem.



Só há uma oportunidade

De ser quem sou na vida.

Se a perder, eis que se evade

E jamais me há-de

Ser de novo remetida.



Tentarei conciliar

Para não magoar.



Porém, à dependência insustentável

Direi basta,

Ou a vida incontornável

Logo nos vergasta,

Madrasta.



E, por norma,

Da pior forma.



Quanto mais eu resistir,

De ser livre me adiando,

Mais violenta a ruptura há-de vir,

Sangrando.



Mais vale ser livre sendo quem sou,

Eventualmente alguém magoando,

Que mais suave à vida então me dou

E a vida já não terá de vir

Com a marca de quem marca quem atingir.



Ser quem sou é o formato

De pôr fim à perda em mim e nos mais:

Irei evoluindo de acto em acto

E ajudarei a evoluir com tais

Sinais

Os que o que eles são não respeitam

E doravante a tal se ajeitam.



Indo assim damos início

A trepar do Infinito o precipício.





Afirma



Meu ego me afirma a mim

Desprendido

Do infinito, de minha origem e meu fim,

A meu estreito canto remetido.



Mas depois pretende crescer

Sem em nenhuma medida caber.



E quer coisas

E a gente a correr delas atrás,

Que nem repoisas,

Tal o bem aguardado que cada uma traz.



E, no imediato,

Às vezes até satisfaz.

Porém, mal me precato,

Se reparo à distância,

Esta inesgotável ânsia

É um desacato:

Nada a realiza,

Sempre desiludida e frustrada...

Que é que, afinal, visa

No roteiro da fatídica estrada?



Perco mais e mais a alegria,

Nada me dá gosto,

De alma vazia.

Em que é que, no fundo, aqui aposto?



O que importa é o longo prazo

Que não seja angustiante

Nem aqui nem lá adiante.

Que é que a isto irá dar azo?



Só o outro lado de mim

Em que me vislumbro sem fim,



Em que me fito

Vocacionado, à partida, para o Infinito.



Quando entro em meu interior,

Na emoção mergulho funda,

Me extasio no fulgor

Que me inunda

Ao aflorar algo do Infindo ao cimo

De meu imo,

Aí a ponta do véu

Soergo e vislumbro o Céu.



E tudo agora é o contrário:

O caminho

De que me avizinho

Tem de vez outro sumário.



Só quero o que na vida for para mim,

Que me atrai da fundura de meu confim.



Rejeito o que para mim não for,

Se em meu afecto eco não há de tal teor.



Tal é nos relacionamentos,

Nos bens materiais,

Nos momentos

Cruciais

Das escolhas,

Nas propostas que acolhas...



Primeiro é preciso rejeitar,

Para criar o vazio,

A fim de poder dentro de mim germinar

O que de mim for deveras, de meu ousio.



Se eu quiser logo o que for,

Não encontro o meu teor:



Demora tempo ao meu afecto

Dentro de mim a encontrar tecto.



Tendo a fugir ao vazio

Que meu ego tanto detesta

E, por um fio,

Perco então tudo o que presta.



Para em mim encontrar alma

E desactivar meu ego

Terei de prescindir da palma

A que me apego:

Segurança, imunidade, poder, domínio...

- De todo o falso brilho do fascínio.



Por aqui terei sempre mais do mesmo:

Minha vida a infernizar-me num torresmo!



Para eu ser quem ele é,

(Não quem eu sou)

Ali a pôr de pé

A cela de prisão que me enclausurou.



A incorporar um personagem,

Não a mim,

Quando desta vida a viagem

É para harmonizá-lo e pôr-lhe fim.



Ter alma é viajar por mim dentro

Até ao centro



E daí para fora

Sem demora,



Do mistério de mim a ir erguendo o véu,

A vislumbrar a minha

Pontinha

De Céu.



Correr e lutar para não chegar

A lugar nenhum... Que fastio!

Apenas para não tropeçar

No vazio!



Soltando o que não é para mim,

O vazio vem vindo.

Fico com medo numa vida assim,

Que ignoro onde vou caindo.



Porém aí

É que vi.



No susto

Do desconhecido

É que, a custo,

Hei aprendido.



A dor velha que me chega

O susto que me prega!



Acolho-a, sofro o que dói

E me remói



E, enquanto a fito,

Vislumbro a saída universal em que medito,



A atitude que o Cosmos harmoniza

E me traz,

Desta guisa,

A paz.



Da melodia entrei na faixa

Em que toda a nota encaixa.



No momento em que aceito

Dou o salto para o Infinito:

Cresço dentro do meu peito

A ser quem deveras sou.

Tudo já principiou:

Já sou Tudo. Nem acredito!





Apenas



Ama apenas, sê divino,

Sê cósmico, universal,

Sem ter nenhum retorno clandestino,

Sem paga nem a bem nem a mal:

Amor incondicional.



Não se ama com “se” nem “mas”,

Não se ama por qualidades

Nem desama por defeitos,

Amamos quem está por trás

De todas as virtualidades,

Matriz de todos os feitos.



Sente, pois: não julgas nem impões

Quaisquer condições.



Não esperes nada em troca,

Que o amor a ele próprio se basta.

Ao senti-lo, já te coloca

De ti mais junto ao teu melhor,

De tua casta

No patim superior.

De algo ou de alguém

Não é por mor

Que amor se tem.



Eu amo a matriz primeira

Que tudo e todos emparceira



Na raiz fundamental

Ou meu amor ainda não é universal.



Minha frágil alma inda tem de sofrer

Mais dor de crescer.



Quem um raio vislumbra de inspiração

Divina

Porque não faz tudo ao alcance da mão

Para mantê-lo na própria sina?



Porque tudo reduz a outrem e noutrem projecta

O alvo Infinito que era a verdadeira meta

A que eternamente se inclina

Aquela seta?



Se outrem não lhe corresponde,

Não ama de volta,

Mata o amor que por ali ronde,

Presa a liberdade que já era solta.



Eterniza o sofrimento,

Mergulha-o no mundo, do vindoiro para tormento.



O amor ama,

Não requer o mesmo de ninguém,

Menos ainda reclama

Que seja quem alimenta e mantém.



Por isso pode amar o mundo inteiro,

Sem nenhuma exclusão

Nem nenhum parceiro,

O alegre repique dum único coração.



E a matéria ilumina-se da magia

Da mais feérica e universal utopia



Que na Terra, por tuas mãos, então planta

Tudo o que do Infinito nos encanta.



A partir do momento em que não dependes de ninguém

Para manter vivo o fogo no teu peito,

O Além,

Com jeito,

Gradualmente em ti se encerra

E, a ti afeito,

Descerra

O Céu na Terra.





Entrosamos



Porque é que tão pouco nos entrosamos

Com o espírito de Deus?

Mesmo com Jesus que rejeitou todos os amos

Porque não viajamos

Pela fímbria dos céus?



Temos um ego muito activo

Com a mente escrava a manter-lhe o arquivo:



Queremos coisas,

Queremos conseguir,

Temos objectivos a perseguir

E o registo nas loisas

Para, com valores enaltecidos,

Sermos reconhecidos...



É o que a entrada bloqueia

À Luz que encandeia

E me devia incendiar

Por inteiro o meu lugar

E não incendeia.



Findo acachapado na pista

Duma norma egoísta,



Bem longe da utopia universal

Que me entusiasma como meu fanal,



Meu coração

Quase enterrado no túmulo do chão.



Terei muito que desobstruir

Minha morada

Para me abrir

Da Luz à entrada.



Perder a resistência,

O controlo,

Acabar com a violência,

O apego a este solo,



Fim à culpa, ao julgamento,

Ao medo,

Deixar de boicotar o meu momento

Doutrem com outro credo.



Deixar de manipular,

De, obcecado,

Me obstinar

Com todo o meu saber dogmatizado,



Perder a força

A fim de, frágil,

Me tornar ágil

Nos íntimos saltos de corça,



Desactivar a luta,

Trocá-la pelo acolhimento

- Para que nunca mais discuta

Das bênçãos cada elemento



E fique, desde o fundo, em maravilhada comoção

A vibrar de gratidão.



A vida é um infindo diálogo

Entre mim e o Universo,

Onde as folhas do catálogo

Disperso

Sempre ele anda a recolher

Do que mais me convier.



Aquilo que me ocorreu

Agradeço como o meu

Melhor roteiro de vida.

Em seguida,

Abrem-se as portas do Céu.

Aí me rendo e entrego

À Luz, a tudo o mais cego.



Aí já não quero nada:

Então escancarei a entrada.



Aí, nos inefáveis murmúrios seus,

Vislumbrei Deus.





Crescem



Quando as almas crescem, os sinais mudam,

Do lado de cá e do lado de Lá,

Para que os espíritos melhor nos acudam

Desde já.



O crescimento espiritual

Muda a linguagem

Quando o sinal

Pode apontar

O nosso olhar

Para mais larga paisagem.



Melhora a precisão

Da comunicação

De modo diferente

E a intuição

Dá logo um salto em frente.



Melhora nossa interioridade

Ao sarar lacunas,

Das atitudes ao cultivar desertas dunas,

Doravante abarcadas pela nossa autenticidade

Num mais alto nível de universalidade:

Nada nem ninguém deverá ficar de fora

Do rumo que viso,

Apesar da demora

De meu siso.



O crescimento de aquém

Soma-se ao de Além

E as almas, de mãos dadas,

Renovam as caminhadas,

Conversando em novo rito

Pelas estradas

Do Infinito.





Dormimos



Nossa mente é vulnerável

Ao bom e ao mau pensamento

Enquanto dormimos, momento

Fiável

Para uma sábia triagem

De qualquer mensagem.



Com a mente a descansar

É mais fácil a nosso imo

Comunicar

O que o Espírito, lá do cimo,

Lhe indicar.



Quando a dormir me ponho,

Comunica-me através do sonho



O que aqui andará torto

Ou já morto



E acaso, do Além,

Que mensagem me advém.



Pode ser daqui

O que me amedronta ou me sorri



Ou, mais do fundo,

Uma imagem projectada doutro mundo.



Poderei tocar o mais verdadeiro,

O melhor e pior de mim inteiro,



E do Outro Lado ser acolhedor

Do que me queiram propor.



Aí me abeiro

E concito

O teor

Do Infinito.



Desmonto o passado,

Vislumbro o presente

E neste traslado

Assente,

Inauguro

O futuro.





Aspectos



Os sonhos têm amalgamados

Mil aspectos variados

Em camadas sobrepostas

De sentidos.

Desde as emoções que carrego às costas

De momentos bem ou mal vividos,

No rasteiro dia-a-dia,

Às propostas

De inaugurar um porvir

Que ninguém cuidaria

Que poderia

Vir.



Até um Além

Que por mim dentro advém



E me semeia, fecundo,

Doutro Mundo.





Infinitamente



Há infinitamente mais na vida

Do que logro cheirar ou ver,

Palpar, saborear ou ouvir,

Do que ando a racionalizar com a desmedida

Lógica que tiver

A me servir.



Nem a ciência me vale:

É melhor que um pouco cale



Para poder sentir o ronco profundo

Das entranhas íntimas do mundo,



Para trazer até à minha vivência

Aquela incomensurável ausência.



Ausência que principia de meu íntimo a mim

E de mim se prolonga até à infinidade do Fim.





Entidades



As anjos estão por todo o lado,

No íntimo de todas as coisas, de todos e de tudo,

Deus em entidades trasladado,

Personalizado,

Comunicador ou mudo,

Na Terra, em qualquer astro

Do Universo,

Sempre nas ameias de cada castro,

Sentinelas contra tudo o que for adverso

Ao incomensurável fito

Do Infinito.



Até vivem calmamente entre nós,

Seres humanos de almas angélicas,

Recobrindo nossos prós

De apetências

Célicas,

Abandonando para trás ancestrais preferências

Bélicas.



São nossos guias

Do imo nas periferias



Ou ao nosso lado

Num corpo materializado.



Disfarçam-se tão bem de gente comum!

Não é requerido uniforme

Nenhum

Nem uma transformação enorme.



Almas angélicas moram vivas

Em quantos habitam a Terra,

A apelar-nos, furtivas,

A aumentar o número de quem se lhes aferra:

Nós, anjos futuros,

Daqui a saltar os muros.



Vivem entre nós

E cá dentro,

Atando, deles com os discretos cipós,

A periferia e o centro.



Todos temos um bocadinho de anjo

Em nosso imo:

É da ementa dele que manjo

Da terra ao cimo,

Ou apenas ranjo,

De negatividades num arranjo

A que me arrimo?



Tudo é de Deus uma extensão directa:

Nós, os anjos, o Universo inteiro.

E todos somos energia,

Ou num corpo recolecta

Ou no viveiro

Da interior magia,

Alma cuja realidade

Mergulha por dentro da Infinidade.



Ao fazermos a travessia

Para o Além,

De Deus nos fundimos com a energia,

Como o corpo se funde também,

Gradualmente disperso,

Com a físico-química do Universo.



Tornamo-nos parte de Deus,

Juntando-nos a todos nos Céus.



Enquanto na Terra vivemos,

Parte do imo unido a Deus permanece,

Enquanto o desafio enfrentemos

De cultivar e colher os frutos de nossa terrena messe.



Nossa união com Deus é escassa

E falha,

Enquanto a dos anjos congraça

Dos Céus infindos a cimalha.



De Deus nossa fatia

De energia

É pequena

E vai com o tempo eventualmente crescendo,

Pretendendo

Devir plena.



O anjo mais evoluído

É de energia divina tão repleto

Que de Deus é o dedo estendido

Completo.



Nosso imo é angélico,

Embora no começo.

E, se não tropeço,

Angélico acaba, que de Deus vivo famélico.



Ao mundo físico chegando

Nas almas com um anjo pequeno,

É de irmos tentando

Servir-nos dele para desbravar terreno:



Dar, ajudar e realizar

Quanto for bom,

Abnegadamente,

Sem desejar,

Seja lá qual for o tom,

Pagamento

Nem reconhecimento.

Simplesmente

Ser espiritual,

A meu anjo o mais possível igual.



Com as habilidades que Deus me deu,

Embora escolhendo eu como.

Serei uma pontinha de céu,

Quase meu anjo ali retomo.



Quando algum bem lhe chegou

Quando dele precisou



E agradece o oportuno arranjo

Com um sentido: “és um anjo!”,



Não é uma figura de estilo:

- É mesmo verdade tudo aquilo.





Chamo



Quando me sinto bloqueado,

Chamo o mundo espiritual

Para se pôr a meu lado

E acolho dele o sinal.



Para onde quer que me guie,

O que quer que desafie,

É por aí que me vou.

Quando meu íntimo fala,

Dali meu pé logo abala,

Nem sequer já sei quem sou.



Que importa?

Abri a porta

E me esgueirei:

Do Infinito

Com meu grito

Começo então toda a lei,

Que pertenço dele à grei

Que desde então em mim fito

Em tudo o que em mim concito.





Morrer



Ao morrer, fico em paz,

Estou com Deus, sou parte dele.

Vivo o amor incondicional que me traz

À flor da pele

Pensamentos,

Experiências,

Sentimentos,

E vivências

Que todos, em seu íntimo teor,

São amor.



Mais nada:

É a plenitude consumada.



Preciso de muito tempo, em meu imo,

Para crescer rumo a Deus

E este desenvolvimento para o cimo

É guiado de perto

Por almas do lado dos Céus,

Seja qual for por aqui o meu deserto.



E no momento

Do julgamento,



Deus não é assustador nem vingativo

Mas carinhoso e compassivo.



E não há condenação eterna

À perna



De ninguém,

Sejam quais forem os defeitos que tem.



O inferno,

Enquanto eterno,



É mera teórica possibilidade

Que a ninguém, ao fim e ao cabo,

Nem ao diabo,

Definitivamente persuade

Nem invade.



Não há um anti-Deus:

Tudo, no limite do fim, serão Céus.





Confiar



Confiar em Deus,

Tudo bem.

Como entender, porém,

Os desígnios seus?



Não lhe ouço a voz

Nem apreendo linguagem corporal...

Então, após,

Qual o sinal?



Ausculto meu imo,

A acolher o que sinto.

Mas quantas vezes me minto,

Tomando a mente rasteira pelo cimo!



Todavia,

Quanto mais confio,

Mais fácil devém o fio

Da minha via.



Deus nunca nos deixa pendurados:

Teremos o apoio de que precisamos

Nos momentos azados,

No lugar onde nos encontramos,

Conforme o plano a longo prazo

A que minha vida der azo.



Pode parecer um desvio,

Um inacreditavelmente longo caminho

Para o desafio

Que tão perto adivinho.



Pouco importa.

Se Deus

É que a tal me exorta,

No fim vislumbro os Céus.





Furioso



Furioso com Deus, podes virar-lhe as costas,

Que ele não vai a lado nenhum.

Continua centrado nas apostas

De cada um.



Perto ou longe nós dele,

Amar-nos-á de igual modo:

Espera que fiquemos prontos e então nos impele,

A nos guiar para o Infinito bodo.



Quer que saremos

Para avançar,

Que nos centremos

No bem-estar



Dos entes queridos

Já falecidos



Para a negatividade

De crescer não nos impedir

Nem de sentir

Serenidade.



Deus não quer mais nada

Senão nós numa cósmica avançada.





Modelo



A gratidão

É uma emoção

E um modelo radical

De orientação,

Ao julgar a vida como especial

E ao ajudar-nos a pensar como cumeeira alta

O que temos

E não o que nos falta.



Podemos

Sentir-nos gratos, de abençoados,

Mas não é uma afirmação,

É um modo de vida em acção

Que dentro nos inunda

E fecunda

Por todos os lados.



Uma acção

Fala mais alto que as palavras

E a gratidão

Ajuda à motivação

Para semearmos da vida as lavras



Com mais empatia, gentileza,

Generosidade, sensatez e beleza.



Nosso imo

E os demais

Entes espirituais

Que com ele se interligam lá no Cimo

Ficam gratos

De bondade pelos actos

Que partilhamos

Pelos outros que ajudamos.



Atenção

À primária

Habituação

Da rotina diária:

A bondade também

Deve saber bem.



E nada de agir

Para melhor abrir



As portas do céu.

Agir sem labéu



A Deus é presenteá-lo

Com o nosso regalo,



Mais nada.

Faço porque desejo fazer,

Não por um prémio poder

Ganhar à chegada.



Actos sinceros

Levam o íntimo a crescer

De rasteiros egoísmos meros

A universais, sublimes heroicidades

Que não é qualquer,

Em quaisquer idades,

Que as vislumbrará sequer.



E é mesmo no mais humilde cotio

Que da universalidade incarnará o brando

Comando

Do fio:



Ter em conta tudo e todos

No gesto meu,

Fazendo-lhes o que quero que me façam,

Eis os modos

Que comigo congraçam

Todos os recantos do Céu.



A boa intenção

Não é um meio para atingir um fim

Nem este é razão

Para tê-la em mim.



Ela vale por si

Porque é a minha plenitude:

É o sonho de infinitude

Que nela entrevi

Que me obriga a que a ela me grude.



O pequeno gesto,

O pequeno esforço

Com que a outrem e a mim agrade

É o apresto,

É o escorço,

É a grade

Com que ando

Gradando

A Eternidade.





Tóxica



O Espírito jamais quer

Tóxica gente em minha vida.

Se o desentendimento, porém, que houver,

É trivial,

Mal-entendido com que mal se lida,

Nenhum deveria impedir

A cura final

De construir

Relacionamentos.



É que eles é que são os filamentos,

Afinal,

Que cosem todos os elementos

No tecido do Total.



São os fermentos,

Na masseira do finito,

De todos os intentos

Do Infinito.





Ladeiras



Culpa, vergonha, arrependimento,

As três ladeiras cujo pendor

De sofrimento

Me paralisam no estupor

De cada momento,



Rápido declive

Para o infeliz pensamento,

A infeliz alma que vive

Por detrás da grade

Da dificuldade.



Olhemos melhor

O fardo que carregamos.

Úteis nalgum instante revelador,

Porta aberta

Para um alerta,

Culpa, arrependimento e vergonha

São três ramos

Dum explosivo que a qualquer alma se imponha.



E, abatida,

Ali a vida

Devém medonha.



Não servem nenhum fito construtivo

Aqui nem no Além,

Senão como desafio a superar, em ferimento vivo,

Enquanto aprendo a lidar como convém.



Abandonemos, pois,

Culpas, vergonhas e pesares.

Senão, abraçar a vida que remóis,

Como Deus quer e nossos avatares,

Por muito que seja desejável,

É inviável.



O apego àqueles sentimentos

Apenas trará tormentos:



Enterra-me, raso,

No chão, a prazo.



Ora, meu imo

Apenas descansa

A ver se alcança

Do Infinito o cimo.





Ajudamos



Ajudamos a criar nossa saúde,

Em virtude

Dos valores, das crenças,

Da atitude

Como vivemos da vida as sentenças.



Sentimentos negativos

De ódio, raiva, vergonha, culpa, medo, tristeza,

Falta de motivos,

Falta de perdão (que até mesmo se despreza)...

- Agravam a doença

E dificultam recuperar-lhe da infausta presença.



Resistir à aprendizagem vai pôr fim

À cura que poderia haver em mim.



O modo de reagir a uma conjuntura

Ou memória

Pode prejudicar

O bem-estar:

Ver-me como vítima que perdura,

Inglória,

No desatino

Do destino

Encurrala-me impotente

Perante a mazela existente.



Ao invés, partilhar amor,

Amizade,

Fraternidade,

Sentir pertença seja ao que for,

Já que tenho por onde escolha

E que escolho um bom caminho

- Muda de mansinho

O que farei e o que recolha.



Devirei saudável,

Não do regime alimentar e do exercício,

Mas da vivência diária, contínua, irrevogável

Que inteiro me envolve, sem largar fora nenhum resquício:

Corpo e alma na unidade

Da sua infinita diversidade.



O itinerário de cura é permanente,

Mesmo após transpor os desafios,

Que, logo à frente,

Dantescos,

Se renovam sem fastios

E mais e mais gigantescos.



Do Infinito a romagem

Jamais consente paragem.





Dura



A cura é sempre fluída,

Dura indefinidamente,

Não há ponto final.



Dois passos em frente,

Um atrás, na recaída,

Outro após, contra a corrente,

O roteiro nunca tem um terminal.



A paragem

No caminho

É só o descanso na viagem

Que ao Infinito adivinho.



Um estado

Consumado

É um engano

E só traz dano

Ao enganado.



Um dano pessoal

Que a vida lhe murcha, letal.



Um dano colectivo

Que um Estado, uma civilização,

O mundo global

Abandona onde estão,

Num falso convencimento, decisivo

Para estiolar a terra

E culminar em guerra.



Um dano institucional

Que qualquer religião

Aprisiona na rotina tradicional,

Convencida

De que a salvação

Tem ali a guarida.



E é o abismo

Do inferno

Aberto ao terrorismo,

À excomunhão,

A um colectivo pecado

Aqui, neste lado,

Eterno.



A cura sempre existe,

Para sempre é que não.

Quem lhe resiste,

Infrene,

É que é a origem de nossa mais perene

Lesão.



A paragem

No caminho

É só o descanso na viagem

Que ao Infinito adivinho.





Voltar



Umas férias à descoberta

E depois voltar para casa.

Emigrar à descoberta

E depois voltar para casa.

Viver a vida à descoberta

E, no fim, voltar para casa.



E, quando em casa,

Sonhar e falar só da aventura da descoberta.



O prazer

Reside na carência, na falta:

No que ela nos permite fazer

Dum sonho em alta.



Suga-nos toda a interioridade

Atirando-nos rumo à Infinidade.





Salvei



Salvei alguém,

O País, a Humanidade?...

Temporariamente, porém:

Toda a salvação é temporária, por fatalidade.



Ganhei-lhes um minuto

Que lhes pode dar uma hora

Que lhes pode conquistar um ano...



O produto,

Por maior que seja a demora,

É sempre um engano:

Ninguém lhes há-de

Dar a ganhar a Eternidade.



Do Infinito na estrada

Dei-lhes apenas um minuto, pronto.

Pode ser tonto,

Mas é mais do que nada.





Universo



O Universo adora que reparemos nele

E recompensa a inteligência que lhe sele



A elegância observada.

Quem sou eu para afirmar que não é nada?



Ou que dele o sumário

É que é tudo temporário?



Chega aqui a partir da Infinidade,

Parte daqui para onde? Que é que ele invade?





Eternamente



De quantos infinitos

É feita a Infinidade!

E eu, aqui, entre aflitos

Eternamente finitos

Ante o desafio da Eternidade...





Suficiente



Gostaria de ser o suficiente para ti,

Mas nunca nada nem ninguém

Poderá ser.

É, porém,

Tudo o que tens aqui,

Não há mais sequer.



Tens-me a mim, à tua família, a este mundo:

É isto a tua vida.

Tenho pena de ser tão infecundo,

Mas é a tua última e única guarida.



Mas como eu gostaria

De ser a outra via!



Oh, céus,

Como eu gostaria de ser Deus!





Universo



Um Universo elegante

Num movimento constante,



Pejado de ruínas destruídas

E reconstruídas



E de crianças aos gritos

A sonhar com Infinitos...



E todos nós aqui no meio

Deste enleio.